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"Há uma semana fechados na casa de banho"

Tiago Gonçalves

Passaram-se alguns dias desde a publicação do Despacho 7247/2019, o tal que versa sobre as medidas administrativas que as escolas devem adotar relativamente ao direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e o direito à proteção das características sexuais de cada pessoa.

 

Nos últimos dias foram vários os artigos de opinião, as entrevistas, as conferências de imprensa e os esclarecimentos prestados por variadíssimos atores da nossa sociedade. De jornalistas e comentadores, de políticos, do próprio Secretário de Estado, de professores, de alunos, de alunos trans, de pais e de pais de jovens trans. O tema esteve nas televisões, nos jornais, nas revistas e, claro está, nas redes sociais.

Passaram-se alguns dias, muitos até, mas ainda há quem diga e escreva, que este despacho é sobre as regras de frequência das casas de banho e, mais grave do que isso, ainda há quem continue a mentir com todo o descaramento sobre essas regras de frequência das casas de banho nas escolas. Ao dia de hoje, depois de tudo o que já foi dito e escrito, a mentira tem uma de duas origens: um deficit na capacidade de compreensão (vulgo, estupidez) ou um deficit nos índices de humanismo (vulgo, malvadez). Embora esteja na moda dar tempo de antena, palco e poder à estupidez e aos estúpidos (quero acreditar que é apenas uma fase estúpida, lá está!), não me parece que neste caso em concreto seja essa a principal origem da mentira com a qual tentam contaminar a sociedade portuguesa. Restam-nos então os malvados. O que não deixa de ser curioso, já que muitos desses malvados se afirmam como cristãos e por isso, (como se isso por si só bastasse), praticantes do Bem.

Na minha opinião, praticar o Bem não se restringe a duas horas de missa ao domingo, a evitar um bife do lombo na semana da Páscoa, ou nem mesmo a uma semana de voluntariado com os pobrezinhos. Praticar o Bem é sobretudo estar disposto a isso. Amanhã, hoje, daqui a um mês ou daqui a um bocado. Numa ocasião especial ou sem hora marcada. É pensar menos em nós e mais nos outros. É abdicar ou, às vezes, apenas compreender. Compreender, por exemplo, que há pessoas socialmente mais vulneráveis (porque as sociedades, bem ou mal, são construídas em cima de valores culturais que julgamos inquestionáveis, alguns dos quais manifestamente cruéis para com algumas das suas franjas) e entender a dor e o sofrimento a que estão sujeitas. Às vezes, praticar o Bem, é apenas e só isto. E o Despacho é apenas e só sobre isto. Compreensão e respeito pelo próximo.

Às vezes, praticar o Bem, é apenas e só isto. E o Despacho é apenas e só sobre isto. Compreensão e respeito pelo próximo.

Um respeito e compreensão que passam, por exemplo, pela sensibilização do pessoal docente e não docente, dos alunos e dos encarregados de educação para esta questão, através de sessões de esclarecimento; pela liberdade destas crianças poderem usar a casa de banho e/ou o balneário de acordo com a opção com a qual mais se identificam (Sim! Também passa por aqui), mas sobretudo, e “sobretudo” porque este é o ponto mais valorizado pelas crianças em fase de transição e pelas suas famílias, um respeito e uma compreensão que passam pela adoção por parte da Escola, em todos os seus registos oficiais e em todas as suas atividades, do nome pelo qual a criança pretende ser tratada. Apenas e só isto. Compreensão e respeito pelo próximo.

Gente malvada, vocês cansam! Deixam-me extenuado com os vossos pensamentos mesquinhos, antigos e intrincados. Tonto e agoniado com o cheiro a naftalina das vossas ideias turvas e roídas pelas traças. De uma vez por todas, este não é um tema sobre casas de banho. Este é um tema sobre ajudarmos a minimizar o sofrimento de algumas crianças. Melhor! Este é um tema sobre ajudarmos a minimizar o sofrimento de algumas crianças, sem que para isso tenham de mexer uma palha. Uma coisa é certa: se depois de tudo o que foi dito e escrito na última semana vocês ainda não saíram da casa de banho, então é porque há muita merda nessas cabeças.

 

Tiago Gonçalves, publicitário

 

O autor usa a nova  ortografia.