Faleceu Guilherme de Melo, figura histórica da comunidade gay portuguesa
![](https://fotos.web.sapo.io/i/Bcd13c8ed/15174344_LIHsw.jpeg)
Guilherme de Melo morreu este Sábado aos 82 anos no hospital de São José, em Lisboa, vítima de cancro. Nasceu em Lourenço Marques (actual Maputo) a 20 de Janeiro de 1931. Ficou conhecido pelo trabalho como jornalista e escritor. Foi uma das primeiras personalidades a assumir publicamente a sua homossexualidade em Portugal.
Casou com uma mulher, mas pediu a anulação do casamento por sentir que não podia viver senão como homossexual, uma identidade que assumiu corajosamente num meio preconceituoso. Em Outubro de 1974, mudou-se para Lisboa, indo trabalhar para o Diário de Notícias. Algumas das suas obras tratam de temas da vivência homossexual, como "Sombra dos Dias" (1981) ou "Gayvota: um olhar (por dentro) da homossexualidade" (2002).
Foi um dos melhores amigos de Carlos Castro. Aliás, após o seu assassinato recordou ao jornal I como conheceu o cronista social: "Foi em 1975. Eu vim de Moçambique e ele de Angola, no rescaldo da descolonização (...) Veio em ponte aérea sozinho. A família veio depois noutro avião e foram conduzidos para algures no Norte do país. O Carlos ficou sem saber onde estava a família. Andou desesperado e até passou fome. Chegou a dormir algumas noites no vão de escadas de um prédio do Príncipe Real. Quem lhe deitou a mão foi Rute Bryden."
Nessa mesma entrevista, Guilherme de Melo refere que nunca conseguiu esconder a sua orientação sexual. "A maioria dos gays funcionam em gueto. Eu nunca o consegui. Tanto que não pertenço nem à Opus Gay nem à Ilga nem a nada disso. Conheço e apoio, mas não pertenço." O mesmo tinha já acontecido em Moçambique. "Tive um companheiro lá com quem vivi sete anos e que apresentava a toda a gente como o meu companheiro. Toda a gente ficava assim surpreendida e eu dizia: 'Sim, sou homossexual, se quiser continuar a conviver comigo, óptimo, se não, paciência'. Sou muito franco. E nunca fui achincalhado, humilhado, nunca tive nenhum amigo que se afastasse por eu ser homossexual. Isso é o meu orgulho", referia. Aliás, nessa fase quando contou aos pais que era gay teve como resposta: "Não nos estás a dar uma novidade. Continuas a ser nosso filho e, se a pessoa que escolheste é digna de ti, queremos conhecê-lo". "No dia seguinte, estávamos todos a jantar em casa dos meus pais", contou Guilherme de Melo
Manteve a mesma postura quando foi para Lisboa trabalhar no Diário de Notícias. "Toda a gente sabia que eu era homossexual, vivia abertamente". "O meu companheiro ia buscar-me ao jornal, cumprimentávamo-nos com um beijo na boca, à frente de toda a gente. Eu e o Ilídio fomos o primeiro casal homossexual a ir à televisão", relembrou. Foi em 1982 que participou num programa sobre homossexualidade "com um padre, um psicólogo e um psiquiatra e uma mãe de família, a Teresa Costa Macedo. Perguntei ao meu companheiro se queria ir e fomos", contou. E assim se fez história para a visibilidade dos homossexuais em Portugal.