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"A Abolição do Género para a Sua Expansão" de Ira Hybris

Abolição do Género para a Sua Expansão, de Ira Hybris

O livro A Abolição do Género para a Sua Expansão, de Ira Hybris, propõe uma visão que defende a superação dos papéis de género e das normas sexuais. Inspirada em pensadoras como Gayle Rubin, Monique Wittig e Mario Mieli, a autora rejeita as categorias fixas de "homem" e "mulher", apontando para um futuro livre de imposições identitárias. A obra traça uma genealogia do transfeminismo e destaca as primeiras teses que questionaram o género como uma construção social e política opressiva.

Hybris faz uma ligação entre o género e outras dimensões, nomeadamento o colonialismo, ao explorar como a renúncia às categorias de homem e mulher pode ser uma prática decolonial, desafiando as hierarquias coloniais que perpetuam essas categorias. No entanto, os argumentos apresentados neste ponto pareceram-me, em alguns momentos, um pouco frágeis e excessivamente forçados.

O ponto central do livro é a crítica ao capitalismo, que, segundo Hybris, se sustenta na construção do género. Este explora os corpos femininos para a reprodução de novos proletários e remete às mulheres o trabalho não pago, perpetuando a desigualdade e a exploração capitalista. Ao mesmo tempo, marginaliza corpos transfemininos, que desafiam a lógica reprodutiva e a família tradicional, pilares fundamentais da sociedade capitalista.

A autora também examina o feminismo abolicionista contemporâneo, que procura desmontar as estruturas que sustentam o patriarcado, o capitalismo e o colonialismo. A abolição surge, aqui, de forma ampla, como uma fuga a todas as formas de encarceramento — das prisões físicas às ideológicas.

Ao longo da obra, a autora dá voz às pessoas queer e trans, que subvertem o género: “Aqueles que sofrem mais directamente a opressão adquirem uma maior capacidade de percepção das relações sociais que a tornam possível, logo estão na vanguarda da desnaturalização da categoria homem e mulher." Concordo com esta afirmação, mas, a meu ver, faltou uma crítica mais robusta às expressões binárias que persistem mesmo entre pessoas LGBTI, incluindo em pessoas que se identificam como trans. Este ponto poderia enriquecer a discussão sobre a desconstrução do género dentro da comunidade. Se a abolição do género não acontecer primeiro dentro da nossa comunidade, não podemos aspirar que venha a acontecer fora dela.

Acredito, tal como Hybris, que, se queremos um mundo mais justo e igualitário, o caminho é mesmo a abolição do género. O género é construído para servir o patriarcado e o capitalismo, para criar exploração, desigualdades e aprisionamentos. Sendo o género algo construído socialmente, é possível desconstruí-lo e até alcançar a sua abolição.

Hybris vai ainda mais longe, propõe uma visão utópica, onde a abolição não será apenas do género, mas de todas as normas e desigualdades estruturais da sociedade, sugerindo uma transformação radical que poderia levar a uma emancipação genuína. Talvez falte fornecer-nos uma análise mais pragmática de como isso poderia ser alcançado.

 

Daniela Alves Ferreira

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