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Bullying homofóbico: É a designação certa? O Estado está a proteger as vítimas?

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E se a expressão ‘bullying homofóbico’ não é a mais apropriada para designar a violência física e psicológica que atinge as crianças e adolescentes portugueses em função da sua orientação sexual ou identidade de género?

A questão foi lançada por Bruno Horta, durante a tertúlia “A Influência dos Media, do Bullying e da Discriminação na Vida de Jovens LGBTI", que decorreu este Sábado, em Lisboa. “Em português a palavra ‘bullying’ não ecoa nada. A palavra é inimiga de passar a mensagem. Muita gente não sabe o que significa. A palavra ‘homofóbico’ é ainda pior, porque, aos 12 e 13 anos, não sabem se são homossexuais ou transexuais. O agressor não está a agredir o homossexual, está a agredir uma imagem percebida, uma imagem transmitida. Estamos agarrados a conceitos do seculo XX, às caixinhas de homossexual ou bissexual. O século XXI está a ensinar-nos que temos de ir além destas designações”, defendeu o editor da secção Gay da Time Out Lisboa, no encontro promovido pela associação Tudo Vai Melhorar.

Num final de tarde dedicado a analisar o papel da comunicação social perante situações de discriminação, Bruno Horta considerou que não cabe ao jornalismo a defesa de causas: “Mais importante que tomar partido de causa, facção ou de corrente histórico, o jornalista deve ser mais recuado e dar informação imparcial sobre determinado assunto”.

Do lado da comunicação social, também marcou presença neste encontro Luís Veríssimo, colaborador do dezanove.pt, que contou que “chegam-nos vários pedidos de ajuda ou queixas sobre os casos de LGBTIfobia. Muitos dos casos, apesar da gravidade, não chegam a outros órgãos de comunicação social. As denúncias são, na maioria, efectuadas pelas próprias vítimas, mas também por pessoas que presenciaram casos de bullying. As queixas mais comuns envolvem bullying entre adolescentes”, detalhou Luís Veríssimo, apontando para dois casos revelados no site: um relato na primeira pessoa de agressão homofóbica no Funchal e a denúncia de transfobia na escola António Arroio, em Lisboa.

 

O papel do Estado nos casos de bullying

E qual a protecção que o Estado oferece aos adolescentes vítimas de bullying? A questão foi analisada pelo jurista e comentador da RTP2 Carlos Reis. “O Estatuto do Aluno, aprovado em 2012, prevê o bullying escolar, mas prevê medidas paliativas que não protegem as vítimas. Os problemas de bullying causam tragédias, mas o Direito está muito limitado pelo Estatuto do Aluno e por uma perspectiva pouco clara sobre a questão. Os miúdos não são apoiados com toda a força pelo Estado”, considerou. Carlos Reis apontou ainda para o “abandalhamento das escolas e a retirada do respeito aos professores. Um professor diminuído na sua autoridade e prestígio não tem força para se impor” em situações de indisciplina entre alunos. A outro nível, o jurista referiu ainda os problemas das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ), que poderiam ter um papel mais activo. “As CPCJ mal funcionam e têm poucos meios. São autênticos passadores de futuras tragédias”, acusou.

“O discurso de ódio tem consequências graves na vida de toda a gente, e das pessoas LGBT, em particular. Temos de combater o discurso do ódio com contra-narrativas e alter-narrativas”, alertou, por sua vez, a propósito das plataformas Margarida Saco, do Instituto Português do Desporto e Juventude, promotor em Portugal da campanha Não ao Discurso de Ódio. Esta campanha, lançada em 2013 pelo Conselho da Europa, está a ser implementada em 35 países e foi prolongada até fim de 2017. Os responsáveis continuam a desenvolver ferramentas de denúncias do discurso de ódio.

 

A questão vista a partir dos EUA

Já Dwayne Cline, management councilor da Embaixada dos EUA em Portugal, aproveitou o encontro para fazer o percurso histórico sobre a cobertura dos media norte-americanos às questões LGBT. “Nos anos 10 e 20 do século passado, as pessoas gay eram retratadas como vilãs e pervertidas e isso perdurou até aos anos 50, já depois da Segunda Guerra Mundial”. Em 1969 dá-se a revolta de Stonewall e começam a surgir associações a defender os direitos LGBT. Já nos anos 80, com a epidemia do VIH, “os media colocavam os gays não como vítimas, mas como culpados do problema. Isso galvanizou o movimento gay nos EUA para que a comunidade tivesse uma atenção positiva. Os gays eram retratados de uma forma estereotipada e histérica, com referências a uma forma perversa de viver”, descreveu o diplomata. “Foi nessa altura que apareceram associações e grupos a fazerem lobby pelos direitos políticos dos gays”, enquadrou. Só em 1997 é que se dá uma grande viragem nos media, quando a estrela de TV Ellen DeGeneres saiu do armário. “Foi a primeira vez que me lembro de ver uma referência positiva à questão gay na televisão. Os gays já não eram retratados como marginais, eram vistos como pessoas normais do mainstream, que podiam ser advogados ou médicos”, recordou Dwayne Cline durante o encontro.

 

Na foto, da esquerda para a direita, Luís Veríssimo, Carlos Reis, Luís Pinheiro (Tudo Vai Melhorar), Dwayne Cline, Bruno Horta e Margarida Saco