É Natal, época de união, mas não assim tanto
Queria escrever algo sobre esta época festiva, porém acho que não sou a pessoa mais natalícia para o fazer…
Nesta época festiva que muitos parecem adorar, para uns pode ser um enorme martírio. Para mim esta época, já pouco me diz. Acho que perdi o gosto pelo Natal quando comecei a trabalhar aos 18 anos, numa caixa de supermercado, e testemunhei em primeira mão o consumismo, a hipocrisia e o egoísmo que esta temporada revela. O Natal para mim é para os miúdos, que vivem ainda na sua era de inocência. Pode de facto ser uma oportunidade para reunir a família, rever entes queridos e partilhar bons momentos. Mas será assim para todos?
Estava a ler o artigo de um colega do dezanove (recomendo lerem: Da Taylor Swift ao Brunch: Reflexões sobre Sair do Armário do Luís Miguel Cerqueira. Sobre ser seguro ou não fazê-lo.
Vamos então imaginar num contexto familiar, o que é sair do armário. Gostaríamos que fosse num ambiente acolhedor e de aceitação, mas muitas vezes, mais até do que deveria ser, a família não aceita. Vem a repulsa, as perguntas ridículas…
Imaginem que é a noite da Consoada, e vem o tio (cliché) fazer piadas homofóbicas, toda a gente ri-se, menos tu. Se pensavas em sair do armário e assumir a tua sexualidade perante a tua família, pensas duas vezes depois deste tipo de interacção. Isto é um exemplo de como a dinâmica familiar pode ser angustiante para muitos nesta quadra.
É certo que as pessoas queer não tem uma vida fácil ao longo do ano e o Natal não é excepção. Não quero dizer com isto que somos vítimas, mas de facto são momentos que deveriam ser de união e amor, e acabam por ser o oposto. Para além disto, assistimos também a campanhas de Natal por grandes empresas como foi o caso da Vodafone no ano passado, com o slogan “Nunca é tarde para ouvires o teu coração”, em que retratava uma história queer. Gostaria de saber como se sentem e são acolhidas as pessoas queer nesta empresa. Pergunta genuína. Pois tal como assistimos na altura do Pride, a inúmeras campanhas de pinkwashing por parte de várias empresas e marcas, só que na prática implementam zero medidas para os trabalhadores das mesmas.
Admito que sou uma céptica em relação ao Natal, e tudo o que envolve. Gostaria de mudar isso, e encarar esta quadra com mais gosto e alegria. Contudo não consigo deixar de pensar nas pessoas que se sentem sozinhas, nas pessoas que não são aceites na família, nas pessoas que se escondem para poderem ser aceites, nas pessoas que ficam ansiosas com as dinâmicas familiares.
A todas essas pessoas, não estão sozinhas! Sei que pode ser um momento duro, e damos por nós em ambientes desconfortáveis. Mas somos muitos, e se há altura em que a nossa comunidade tem de ser unir, este é um deles. Apoiar-nos quando a nossa família não o faz. Ouvir os nossos queixumes de lidar com comentários de familiares. Desabafem com os vossos amigos queer! Se não tem ou nem há hipótese sequer de passar o Natal com a vossa família, seja qual for o motivo, a ILGA organiza um Natal Comunitário para que possas celebrar esta quadra em segurança, num ambiente acolhedor e inclusivo.
Por fim, onde quer que passes o Natal, espero que seja num círculo de alegria, empatia e paz.
Feliz Natal, I guess!
Sara Correia