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Emanuel Caires: "Começar a fazer activismo na Madeira não foi fácil"

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Para mim, a Revolta de Stonewall é uma referência e uma inspiração. Não só este episódio em específico, mas todas as pessoas que, principalmente depois da 2.ª Guerra Mundial, reagiram às agressões de que eram alvo diariamente, e às constantes violações de direitos humanos que atingiam a comunidade LGBTI+. Vejo Stonewall como o início do fim da repressão.

 

 

Imagine-se a coragem de sermos nós próprios nos anos 60, onde a homossexualidade ainda era considerada doença, onde vestir roupas do género oposto era considerado ainda mais aberrante que hoje, onde o espaço público não era certamente convidativo a qualquer demonstração do nosso amor e do nosso género. Estas pessoas eram poderosas, e só nos podem servir como inspiração!

 

Antes de me inspirar nas histórias de Marsha P. Johnson e de Sylvia Rivera, foi na rede ex aequo - associação de jovens lgbti e apoiantes, que me deixei inspirar. Em 2015, fui a Lisboa para uma formação de voluntariado que tinha como objetivo criar um Tumblr para a associação. Para quem ainda não era activista, e vivia nas sombras da autonomia da Madeira, esta foi uma formação de empoderamento que serviu para conhecer uma realidade queer diferente da que acontecia na Madeira.

Antes de me inspirar nas histórias de Marsha P. Johnson e de Sylvia Rivera, foi na rede ex aequo - associação de jovens lgbti e apoiantes, que me deixei inspirar.

Confesso que nunca havia sido próximo da comunidade - nem sei se realmente havia um sentido de comunidade LGBTI+ na Madeira. Mas sei que a formação me levou a pensar que estava tudo por fazer na localidade onde eu vivia. Os temas LGBTI+, que naquele fim de semana foram tão abertamente falados, na Madeira não eram uma realidade. Não era um assunto para conversas de café, as vidas queer estavam na invisibilidade e não havia qualquer trabalho organizado para combater a homobitransfobia.

 

Acho que foi por isso que me tornei activista e continuei a fazer voluntariado pela rede ex aequo, de forma muito mais vincada para a comunidade local. Queria realmente fazer a diferença na minha cidade! Então tentei reunir esforços para abrir um grupo local da associação, e começar a trazer o assunto para os espaços públicos. Ainda me lembro do primeiro ciclo de cinema LGBTI que organizamos, em que a RTP Madeira quis fazer reportagem e a sala estava com meia dúzia de gatos pingados - ou nem isso.

 

Realmente, começar a fazer activismo na Madeira não foi fácil. No início, nenhum espaço nos quis receber para actividades, e o grupo local tinha que realizá-las num jardim público. Mas depressa começámos a ter actividades com mais de 15 jovens e começámos a entender que estávamos a fazer a diferença. Mas o barco tanto estava cheio de gente, como não tinha nenhuma e a dificuldade de fazer activismo num meio pequeno começou a fazer-se sentir. O caminho foi criar sinergias e unir pessoas. associações e entidades públicas pela mesma causa, e assim foi e caminhou-se até á realização da 1.ª Marcha do Orgulho LGBTI+ da Madeira.

Começámos a entender que estávamos a fazer a diferença.

Créditos: Margarida Góis, no 1º Madeira Pride

 

Todas estas sinergias permitiram um novo fôlego no associativismo e activismo regional de uma forma geral, com novos movimentos e ativistas a surgirem. Na altura, não entendi que era tão importante empoderar as comunidades LGBTI+ locais para combater o preconceito e se envolverem ativamente na progressão de uma sociedade mais igual. Acredito que se a rede ex aequo não tivesse apostado em mim, não me teria tornado ativista nem a Madeira estava prestes a ter um centro comunitário queer, apoiado pelo Governo Regional.

 

É de se perceber que as associações devem ter um papel cada vez mais activo nas comunidades lgbti+ a um nível local e municipal. As comunidades têm de estar aptas, empoderadas e encorajadas a trabalhar com os municípios e de perto com a sua própria comunidade. E não há melhor forma de empoderá-las do que mostrar-lhes uma realidade diferente da sua cidade, e de continuar a fazer um trabalho de informação e formação nas suas localidades.

 

Não invalidando tudo o que foi feito até hoje, durante anos o activismo ter-se-à focado demasiado nas realidades das grandes cidades. Hoje, vemos cada vez mais movimentos LGBTI+ locais a surgirem e, quando se olha para Portugal num todo, vemos um país cada vez mais arco-íris. Assim, a mudança social acontece de forma mais uniforme, e com as comunidades locais a se envolverem cada vez mais nas mudanças que realmente queremos.

 

Emanuel Caires, activista

 

Créditos das fotos:

Nuno Ferreira Santos (Público)

Margarida Góis, no 1º Madeira Pride.

 

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