Esmiuçar “As implicações do masculino genérico”
Antes de falarmos sobre as implicações do masculino genérico abordado por Clara Não, é necessário perceber o conceito de masculino genérico. Neste caso, masculino genérico ou masculino universal é uma forma de linguagem que utiliza o género masculino como forma de referência a pessoas de ambos os sexos.
Esta forma de linguagem tem sido questionada ao longo dos tempos, por ser supressora e discriminatória para as mulheres, sendo que reforça estereótipos de género e invisibiliza a presença das mulheres em determinadas actividades ou profissões.
O masculino genérico ou masculino universal é uma forma de linguagem que utiliza o género masculino como forma de referência a pessoas de ambos os sexos [...] reforça estereótipos de género e invisibiliza a presença das mulheres em determinadas actividades ou profissões.
Clara Não, destaca três marcos dentro do masculino universal, o primeiro é o uso da palavra “Homem” com maiúscula que simboliza «conjunto de todos estes seres vivos; espécie humana» (Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa). A autora afirma “Começo logo por referir que me recuso a usar “Homem” com letra maiúscula. Se é para representar a espécie humana, podemos escrever “Humanidade” que não perdemos anos de vida a escrever mais umas letras.” Humanidade é um conceito mais abrangente, inclusivo e que não demonstra qualquer supremacia de género.
O segundo tópico abordado pela autora é a ausência feminina na História, referindo que “A História do mundo é-nos contada por homens, escrita por homens, com a perspectiva de homens”. A cronista enumera destaques da História como a “Grécia Antiga”, “o Renascimento” e o “Iluminismo” em que os homens tinham cada vez mais direitos e poder, enquanto as mulheres ficavam com cada vez menos, sendo negado o “controlo dos bens e dos rendimentos e o acesso à educação superior e formação profissional.” (MI, pp 31,32). Para além de História fala de áreas como o Desporto, em que existe desigualdades salarias como também desigualdades de reconhecimento e mérito no que toca ao género feminino. Acrescenta o que acontece em determinadas áreas profissionais na língua inglesa, que por defeito são atribuídas a homens, ficando “Lady Boss” ou “Lady Lawyer”, tornando uma palavra neutra com alguma característica feminina, ou até a distinção de “Literatura” com algo semelhante “Literatura Feminina” em que mais uma vez existe a distinção de género.
Por fim fala da Linguagem Inclusiva, apesar dos países com origem latina, como Portugal, Espanha e França usar o plural masculino para se referir ao masculino e feminino, segundo a autora isso “pressupõe, não esclarece, ou seja, torna a presença das mulheres secundárias, anula até a sua presença.” A cronista profere “O que é relevante perceber é que a língua foi criada por pessoas, por isso pode e é mudado por pessoas. Senão, o latim não seria uma língua morta”. Actualmente não basta usar os dois géneros binários, a partir do momento em que há pessoas não binárias é necessário adaptar a linguagem para que elus se sintam incluídes. Por essas razões nasceu o Sistema Elu, sistema este que será o método mais inclusive para o género neutro. Terminando com uma citação “Quem tem medo de mudança não evolui. Podem escolher não evoluir, mas não critiquem nem condicionem quem se actualiza, quem procura a inclusividade”.
Em Portugal, o debate sobre a linguagem inclusiva ainda não tem um consenso sobre a sua adopção ou rejeição. As pessoas a favor defendem que esse tipo de linguagem é uma forma de reconhecer e valorizar a diversidade de identidades e experiências de todas as pessoas, independentemente do seu género ou orientação sexual, podendo ajudar a promover a igualdade e a justiça social, bem como a prevenir a discriminação e o preconceito. Pode contribuir para uma comunicação mais clara e precisa, uma vez que evita o uso de termos ambíguos que podem levar a uma má interpretação de algo que tenha sido dito, através do uso de pronomes neutros ou a falar de alguém sem mencionar o género. A linguagem inclusiva também aumenta a visibilidade e representatividade de minorias, como mulheres, pessoas não-binárias e pessoas LGBTQIA+, tendo um impacto positivo na vida dessas pessoas e aumentando a autoestima.
Já as pessoas contra a linguagem inclusiva referem que é desnecessária, complicada e difícil de usar, uma vez que exige a criação de novas palavras e o uso de estruturas gramaticais diferentes, o que pode limitar a comunicação, fazendo ser menos eficiente. Outros afirmam que é uma visão particular do mundo e que limita a liberdade de expressão. Por fim essas pessoas argumentam ainda que essa linguagem não é necessária porque a língua já possui formas neutras e genéricas de se referir a pessoas, com o uso do pronome “eles”.
Na minha opinião a língua foi criada por pessoas, para ser usada por pessoas, para que exista um equilíbrio é necessário a utilização de referências que incluam todas as identidades de género, que promova a equidade, a diversidade e que seja inclusiva.
Fonte: Expresso50 – Geração E “As implicações do masculino genérico” de Clara Não
Sara Gonçalves