Flávio Gil em Fada: "Uma canção tem realmente género?"
"FADA - Um Canto à Procura de Voz", junta em palco Flávio Gil e o maestro Mário Rui num espectáculo surpreendente que questiona a identidade de género do próprio Fado.
A estreia ocorreu no passado dia 9 de Abril. Há mais duas apresentações a 16 e 30 de Abril, pelas 21h30, no Chapitô, em Lisboa.
dezanove: De onde surgiu esta ideia de coadunar a questões de identidade de género com o Fado? Em quê ou quem, se inspirou?
Flávio Fil: Esta ideia surgiu ao pensar na minha própria experiência. Quando comecei a cantar fados, ouvi ser dita várias vezes a frase: “não cantes esse fado, é mais adequado para uma mulher” ou o contrário. Questionei-me se uma canção tem realmente género e se um intérprete deve trazer a canção até si ou ir ao encontro dela.
Como é que acha que as pessoas irão lidar com este tema, sobretudo depois da recente polémica relacionada com a alteração do hino nacional, proposta pelo músico Dino D'Santiago?
Não sei. A minha única expectativa é a de combater alguma ideia que quer definir o que alguém pode ou não fazer, sem poder decidir isso sozinho.
Reflectir sobre a identidade de um fado e de um povo é também reflectir sobre a identidade de género da própria língua portuguesa?
A língua portuguesa, sobretudo pela presença que tem em tantos lugares do mundo, deve acompanhar essa dimensão na sua capacidade de incluir, de reunir! É essa, também, a importância duma linguagem cada vez mais inclusiva. Este espectáculo pode lembrar-nos que não importa em que género nos referimos a nós próprios, mas antes a honestidade do que dizemos. No FADA, desafio-me enquanto intérprete a fazer esse exercício.
Se, por curiosidade, este espectáculo ocorresse há 10 anos que impacto social teria diferente do que se espera hoje?
Talvez tivesse mais! Ainda que o caminho a percorrer possa ser longo, cada vez mais se defende a importância da igualdade e essa é uma questão que está hoje na ordem do dia, mais do que há dez anos.
Entrevista de Miguel Oliveira