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Nem na mata se encontram histórias assim

Habitação, lugar onde se habita, lugar de morada, casa

Bernardo Silva

Quantos de vós que me lêem a tem? Somos quantos a querer ter? E tantas outras questões se colocam, quantos somos com possibilidades económicas que consigam suportar o que nos é pedido para ter um tecto?

Quão dispostos estamos para? Na balança pesam questões como, o que vamos pôr na mesa para comer? Vamos ter dinheiro suficiente para as outras despesas? Contas da luz, água, gás, passe dos transportes, e vamos rezar para não acontecer nenhum azar e por algum motivo ficarmos doentes, como o nosso país que é já crónico. 


Não pode existir um não sei o que se passa porque a questão da habitação tem sido discutida, exposta, por isso só pode ser indiferença e é realmente mais fácil ser-se indiferente do que enfrentar a realidade, pensar nela, mesmo que não seja nossa. 

A minha realidade enquanto homem trans que ganha o salário mínimo nacional é a seguinte: abrir todos os dias um sítio na internet e pesquisar por um quarto em Lisboa, Almada, Barreiro, Montijo, Setúbal, lugares onde pudesse ter uma boa rede de transportes, porque pronto, convém, não pode ser tudo tão mau, só mau basta. 
Os resultados da minha pesquisa: vários quartos que são uma possibilidade e que me levam mais de metade do ordenado, mas no desespero tudo é uma possibilidade. Todos os anúncios tem algo em comum, são quartos para meninas, mulheres, senhoras, sexo feminino para que não existam dúvidas, e muitos deles acrescentam ainda que precisam de ser estudantes, é aquele contrato a prazo mas sem dizer que é, do género ficam cá garantidamente três anos e depois a cama nem arrefece porque existe sempre quem queira investir em ter um canudo num país de gente de canudos no desemprego. Mulher e estudante são duas coisas que não sou. Enquanto homem trans que precisa de um tecto, vi-me na situação de ter de me inviabilizar coisa que não permito aos outros fazerem. 
A questão que me foi feita: É mulher? No desespero respondi que sim e foi o pior que fiz. Fez-me questionar o que não se põe em questão, enquanto pessoa trans. Fez-me questionar se estou disposto, que não estou, a deixar para trás, a ignorar todo um processo de consciencialização duro e que em nada é bonito em troca de uma cama? Num quarto que não é quarto muitas das vezes, num apartamento de um alguém que em momento algum mete em cima da mesa as necessidades de outros iguais a si? Os valores praticados não são justificados com as guerras, sem ser a guerra do poder económico mal distribuído na sociedade. Quem é que sai a perder nisto tudo? Não sou só eu pessoa trans, somos todos nós.