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Esta crónica começou a ser escrita ao som da música mais lamechas que consegui lembrar-me: a banda sonora do Titanic. Não por nenhum motivo específico mas apenas para descobrir se a sobreposição de pífaros, vozes sintetizadas e violinos a tocar o refrão do My Heart Will Go On ad-nauseam ajudaria com o writer’s block do qual já venho padecendo há algum tempo. 

 

Já vamos em um parágrafo, por isso a lamechice parece estar a ajudar. Vou aumentá-la uns níveis, colocar a banda sonora do Pearl Harbor e ver se saem mais parágrafos…

Acho que parte do bloqueio ou falta de inspiração tem a haver, em primeiro lugar, com o cansaço de estar a chegar ao final de três meses de trabalho contínuo durante os quais devo ter tido quatro dias de folga a sério e, em segundo lugar, estarmos a entrar naquela fase do ano em que o Universo tira a Mariah Carey do congelador durante dois meses, e em que cada visita a uma qualquer superfície comercial é acompanhada por uma banda sonora que nos diz em tons whistle apenas audíveis por cães ou solteiros: “Parabéns! Mais um Natal encalhado!”. 

Todo este início de Quadra natalícia tem sido, até agora, um lembrete contínuo deste facto: desde a Mariah, até ao email que recebi ontem a avisar que a minha subscrição de um ano do Tinder iria expirar no final deste mês. Fiquei sem perceber muito bem como interpretar o email: o idealista sonhador em mim quis ler o aviso como um augúrio divino de que tudo vai mudar até ao final de Novembro e que, tal como na canção do Billy Porter, Love is on the way. Por outro lado, o autor sardónico que vos escreve rematou inicialmente essa ideia com ‘Sim, pode estar a caminho mas vem de comboio regional com cinco mudanças de linha entretanto’, e eventualmente rendeu-se à ideia de que aquele email era só mais um lembrete de ‘Mais um ano disto e ainda nada!’, com o bónus de me ter relembrado ainda das minhas aspirações optimistas quando comprei a assinatura, do orgulho que senti em mim mesmo por estar a ser industrioso, colocar-me out there, tomar as rédeas da minha vida, sair da minha zona de conforto, vencer a intorversão, etc. Enfim, todo um sem número de coisas inspiradoras que encheriam de orgulho qualquer life coach do Instagram.

Entretanto o Grindr Extra lá vai renovando todos os meses porque se fico limitado ao meu bairro, bem que me fodo (ou não… ênfase no “ou não”).

Tudo isto para dizer o quê? Que a quadra natalícia consegue ser uma das mais triggering do ano, tal como o São Valentim (mas já lá vamos…). Acho que durante tanto uma como outra, todas as pessoas que andam por aí à espera que os seus caminhos se cruzem de maneira significativa com o caminho de alguém, não podem deixar de sentir-se como um ligeiro fracasso por ainda não terem chegado a esse ponto. Um pouco como aquela cena do Diário de Bridget Jones que envolve álcool, lenços de papel e o All by myself. Talvez não tão dramático, mas sempre com aquela pressão a pairar de termos no horizonte refeições natalícias de familia, amigos, colegas de trabalho, etc., durante as quais alguém irá inevitavelmente perguntar quando é que trazemos um +1 para a mesa, e outro alguém decerto bem intencionado vai bolçar a frase “Não entendo como é que um homem bonito e inteligente como tu ainda está solteiro. Os homens devem andar a fazer fila para namorar contigo e tu deves ser exigente… fazes bem”. Frase à qual normalmente se seguem, no meu caso, dois segundos de hesitação entre responder torto, ou sorrir e encolher os ombros e pedir a alguém que me passe o perú, ou outro qualquer alimento de deglutição laboriosa para a boca ficar cheia o tempo suficiente até passar a vontade mandar a Tia Teresinha para o caralho.

Todas as pessoas que andam por aí à espera que os seus caminhos se cruzem de maneira significativa com o caminho de alguém, não podem deixar de sentir-se como um ligeiro fracasso por ainda não terem chegado a esse ponto.

Juntando a isto o São Valentim daqui a três meses, todo este tableau Natal-Dia dos Namorados parece ter sido maquinado aquando da elaboração do calendário judaico-cristão que utilizamos actualmente de forma a celebrar todas as pessoas que estão felizes e com relações, e a instituir aos restantes uma zombaria que dura cinco meses.  Sim, cinco meses, porque contas feitas, a Mariah Carey sai do congelador a 1 de Novembro, depois do Natal vem o Ano Novo e ela só regressa ao frio dois meses mais tarde no dia 1 de Janeiro. Ao fim desses dois meses, é a altura de descongelar a Céline Dion e substituir os sininhos natalícios do All I want for Christmas Is You, pelas guitarradas São-Valentinescas do The Power of Love.

“Não entendo como é que um homem bonito e inteligente como tu ainda está solteiro. Os homens devem andar a fazer fila para namorar contigo e tu deves ser exigente… fazes bem”.

Somos, portanto, atacados durante cinco meses do ano, no dia 15 de Fevereiro começa o recobro que, esperançosamente, estará completo por alturas do Verão de forma a termos três meses de descanso até chegar outra vez o dia 1 de Novembro.

“É fazer as contas”, mas como podem ver esta matemática é um ataque contínuo ao estado civil “não emparelhado”. Os chineses lá tiveram a ideia de celebrar o dia dos solteiros a 11/11, mas por estes lados, a data passa completamente despercebida entre whistles e guitarradas.

Posto isto, resta-me respirar de alívio que o bloqueio criativo parece ter levantado, e despedir-me dos leitores com os votos “Festivos” para toda a gente que, tal como eu, se encontra inextricavelmente  enredada neste volutabro de cor vermelha que se estende de Novembro a Fevereiro. Votos de que “tomem as rédeas da vossa vida, saiam da vossa zona de conforto, coloquem-se out there e vençam a introversão”.

Ou não.

Façam como eu e invistam em boas gotas oftálmicas para poderem passar cinco meses a revirar os olhos frequentemente de forma fácil e lubrificada.

 

R. J. Ripley

 

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