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Livro:"Chamar as Coisas pelos Nomes: Como e Quando Falar de Sexualidade" de Vânia Beliz

Vânia Beliz

O que é a sexualidade e porque precisamos de educar para a sexualidade? Será que educar para a sexualidade é uma função da escola? Porque é que falar de sexualidade haveria de fazer com que as crianças tivessem vontade de fazer sexo? Porque é que, afinal, há tanto receio que os meninos brinquem com bonecas e as meninas com carrinhos?

Estas são algumas das questões com que nos podemos confrontar em “Chamar as Coisas pelos Nomes: Como e Quando Falar de Sexualidade”, da psicóloga Vânia Beliz.

Vânia Beliz, especialista em sexologia e saúde infantil, com obras publicadas na área da sexologia feminina (Ponto Quê”, 2011) e na área da educação sexual (“A viagem de Peludim”, 2016), colaboradora em programas de Educação para a Saúde nas escolas portuguesas (PES), traz-nos neste livro a importância de actualizarmos e aprofundarmos o nosso conhecimento sobre o tema da sexualidade e sua relação com a igualdade, a tolerância e a aceitação da diversidade, de forma a combater tabus, preconceitos e a prevenir situações de discriminação e violência.

Dirigido a pais e/ou educadores, organizado em quatro teses principais: a sexualidade na infância; puberdade, o corpo em mudança; a adolescência; sexualidade e deficiência, este livro pode ser apreciado quer por miúdos como graúdos, na medida em que, fomentando a discussão em torno da sexualidade, ajuda a desconstruir dúvidas e medos infundados, a refletir sobre a nossa existência física, psíquica e emocional, sobre a nossa convivência em sociedade enquanto seres sexuados que somos.

A sexualidade, estando presente desde o momento em que nascemos até ao fim da nossa vida, define-nos enquanto pessoas, das relações que estabelecemos socialmente assim como dos valores sociais vigentes, mostra a interdependência na compreensão da identidade subjetiva da pessoa, seja pela orientação sexual e/ou identidade de género, permitindo o desenvolvimento harmonioso da personalidade. 

Recentemente temos assistido a uma batalha de discursos entre quem é a favor e contra o ensino da sexualidade e cidadania nas escolas. A crença de que abordando o tema da sexualidade entre crianças e jovens, que estas estariam propícias a desenvolver comportamentos sexuais mais cedo. De que as escolas querem retirar a legitimidade e autoridade dos pais em educar para a sexualidade, para a higiene e saúde corporal. O zum-zum em torno da “ideologia de género”.

Vânia Beliz mostra como as famílias são o agente primário e principal na educação das crianças, devendo permitir que as crianças se conheçam bem e que conheçam a realidade que as espera, permitindo trabalhar a sua autoestima, o respeito pela sua vontade e prevenção de comportamentos de risco, de forma que estejam mais preparadas para os desafios e riscos no futuro.

As escolas, não ocupam um lugar de menor importância na comunicação sobre a educação para a sexualidade, para os afectos e para a saúde. De acordo com a especialista, em Portugal, a educação sexual integra os Programas da Educação para a Saúde (PES) a par de questões como a alimentação saudável e o desporto, estando prevista em todos os estabelecimentos de ensino. No entanto, o que vimos é a persistência dos mitos, medos e tabus que dificultam o papel das escolas e das famílias em comunicar sobre educação para a sexualidade. Continuam a resistir os estereótipos de género de que as crianças e jovens não podem ter os mesmos brinquedos, expressar os seus sentimentos da mesma maneira, de que falar sobre sexualidade possa influenciar a orientação sexual da criança e que esta fique confusa. 

A autora mostra como as escolas reforçam a cultura heterossexual, em que as famílias são representadas por pais e mães e que os casais são sempre homens e mulheres, divergindo da enorme diversidade de composição das famílias e do seu direito em serem respeitadas e felizes. Mostra como todos os dias são conhecidos casos de violência de género e sexual, passando despercebida a importância da sensibilização para a sexualidade entre os mais jovens e de como o tabu social dificulta o pedido de ajuda esclarecido.

Parafraseando a autora:

Se temos mulheres adultas que se sentem inferiores, incapazes, sensíveis, frágeis e que serão salvas por príncipes, isso vem certamente da forma como estas foram educadas desde a infância. Se temos homens adultos que têm dificuldade em emocionar-se ou se são acusados de serem pouco sensíveis, isso deve-se seguramente à forma como estamos a reprimir os meninos.” p.69

Educar para a sexualidade e para os afectos é uma forma de evitarmos sermos pessoas amargas em idade adulta devido à educação repressiva que possamos ter vivenciado na infância, impedindo-nos de ser felizes connosco próprias e com os outros. A propósito da violência de género e sexual a autora refere ainda que:

A maior parte dos estudos refere que as crianças sem educação sexual são mais vulneráveis, porque não conhecem o seu corpo, porque não sabem falar sobre os seus sentimentos e/ou porque não sabem verbalizar o que lhes aconteceu.” p.57

Também, não se desvalorizam as questões em torno da Erotização da Infância, do Abuso, do Sexting, Bullying, ou Ciberbullying, da Intersexualidade, da sexualidade e deficiência, da pluralidade de corpos e da relação segura com a descoberta da sexualidade, da promoção da saúde física e mental. Sendo estas e outras muitas mais questões esmiuçadas no livro, mostrando que “a curiosidade é um motor que se sacia com descoberta”, a autora, e eu próprio, recomendamos “chamar as coisas pelos nomes”.

 

Daniel Santos Morais é mestre em Sociologia pela Universidade de Coimbra. Feminista, LGBTQIA+, activista pelos Direitos Humanos. Partilha a sua vida entre Coimbra e Viseu.