“Não tenho nada contra a comunidade LGBT. Mas…”
Num conjunto de entrevistas aos candidatos às autárquicas de 2021, o Jornal do Centro, entrevistou Pedro Calheiros, o candidato do Chega à presidência da Câmara de Viseu.
Entre as diferentes questões relativas ao lançamento da sua candidatura à autarquia, o reformado Coronel da GNR, presenteia-nos com uma lição sobre segurança, justiça e liberdades individuais. Uma lição que, mostra o desafio e ataque que estes valores democráticos enfrentam não só nos dias de hoje, mas nos próximos anos de governação municipal em Viseu.
Entre promessas de “servir os cidadãos de Viseu”, da “necessidade absoluta de dar qualidade de vida às pessoas”, o candidato autárquico pelo Chega, recentemente envolvido num episódio de violência física homofóbica contra um jovem de 26 anos, apresenta uma candidatura aparentemente vazia de fundamentalismos morais, mostrando “até” não ter nada contra a comunidade LGBT, mas…
“Eu não tenho nada contra a comunidade LGBT. Mas se não houver mato não há incêndios.”
Esta conjunção adversativa, exprimindo a sua oposição face à primeira ideia, é acompanhada quase sempre de certa depreciação, para não dizer pior…. Quantos comentários racistas, xenófobos, machistas, homofóbicos, já não ouvimos ensaiar através de um: “Não tenho nada contra pretos/ciganos/gays, mas…”, mas desde que não se manifestem ou coloquem os clássicos códigos e normas heteronormativas em riste, tudo bem.
E isto quer dizer propriamente o quê? Afinal, se os incêndios florestais não se devem mais à causa humana se não à floresta, a homofobia existe pela resistência da diferença? Afinal, então, quem é que queima ou se faz queimar? O candidato Pedro Calheiros, responde ao Jornal do Centro:
“Se houver necessidade de pôr a arder qualquer coisa vão lá pôr o mato. Se não houvesse pobres havia socialismo? Eu acho que não, porque não havia necessidade. Da mesma forma que se não andassem permanentemente com esta coisa, por exemplo, do “black lives matter” e não sei quê.. as pessoas alimentam isso… não há necessidade.”
O entrevistado, por sinal, homem branco, cisgénero, heterossexual, realça que as pessoas LGBT não têm necessidade de “andar a deitar foguetes a dizer que existem… As pessoas existem porque existem” e, quando interpelado sobre se as pessoas LGBT têm na sociedade atual os direitos plenos, afirma: “Eu acho que sim.”
Afinal, prometer qualidade de vida será considerar que todas as pessoas possuem direitos plenos, porque na verdade devem possuir, ou mais considerar que estes direitos ainda que existam não deixam de ser privados ou violados?
Ainda sobre a manifestação das pessoas LGBT em Viseu, o candidato mostra desmazelo no seu comentário assim como uma posição de certa forma ambígua quanto à comunidade LGBT, afirmando:
“Eu penso que é uma utopia alimentar este tipo de coisas. Porque faz de conta que ela não existem, mas precisam de existir quando elas existem de facto. Sempre houve maricas, desde a Grécia em que os soldados tinham um rapazinho que era a pessoa que lhes fazia tudo e favores sexuais.”
Utopia, é não mais que, negar a opressão que grupos desfavorecidos de poder enfrentam no seu dia-a-dia, ao aceder a direitos considerados universais, aparentemente pouco esclarecidos ao candidato do Chega. Quando afirma “Viseu, ainda não é uma cidade insegura”, levanta o véu da invisibilidade para as diversas formas de discriminação perpetuadas neste município, considerado “Capital da Homofobia” em 2005 e que, aos poucos, se ergue para denunciar a não tolerância com agentes de discriminação homofóbica.
Daniel Santos Morais