O Luto Invisível: Como lidar com a perda de relações familiares na comunidade LGBTQIA+
Quando uma pessoa LGBTQIA+, decide revelar a sua orientação sexual ou identidade de género, o momento pode ser libertador, mas também muito difícil. Para muitos, assumir quem são pode significar a perda de relações familiares importantes, gerando um tipo de luto pouco discutido e muitas vezes não reconhecido socialmente: o luto invisível.
Este luto não se refere à perda física de um ente querido, mas à ausência emocional e ao rompimento do vínculo com familiares e pessoas próximas. A rejeição ou o afastamento de quem se ama pode deixar marcas profundas na saúde mental, criando um vazio que não é facilmente preenchido.
O que é o luto invisível?
O luto invisível ocorre quando a perda emocional não é validada ou reconhecida. No contexto LGBTQIA+, ele pode surgir após uma “saída do armário” que resulta em rejeição, silêncio ou afastamento por parte de familiares. Essa dor, é especialmente intensa, porque vem de pessoas que deveriam ser fonte de amor e segurança.
Esta perda emocional, não apenas impacta o bem-estar psicológico, mas também influencia a construção de identidade, auto-estima e a sensação de pertença.
O impacto na saúde mental
A rejeição familiar é um dos maiores factores de risco para problemas psicológicos na comunidade LGBTQIA+. Estudos apontam que jovens LGBTQIA+ que enfrentam rejeição familiar têm uma probabilidade significativamente maior de desenvolver depressão, ansiedade e comportamentos auto lesivos. Além disso, a solidão e o isolamento causados pelo afastamento familiar podem levar a sentimentos de inadequação e vergonha.
Como lidar com este tipo de luto?
Superar o luto invisível é um processo, e cada pessoa encontra o seu caminho. Como psicóloga, aqui estão algumas estratégias que podem ajudar:
- Aceitar e validar os sentimentos
Reconhecer a dor causada pela rejeição é o primeiro passo. Não é necessário minimizar os sentimentos ou compará-los com as experiências de outras pessoas. Este é um processo único e válido.
- Redefinir a ideia de família
Embora a família biológica possa não oferecer o apoio necessário, é possível construir uma “família escolhida” – amigos e aliados que respeitam e validam quem é. Esses laços podem ser tão profundos e importantes quanto os familiares.
- Trabalhar a autocompaixão
Muitas pessoas LGBTQIA+ sentem-se culpadas pela rejeição que sofrem. É essencial lembrar, que a responsabilidade de aceitar e amar não é sua, mas da outra pessoa. Práticas de autocompaixão, como meditação ou escrita reflexiva, podem ajudar a reduzir a autocrítica.
- Participar de grupos de apoio
Conectar-se com outras pessoas LGBTQIA+ que enfrentaram experiências semelhantes pode trazer conforto e um senso de pertença. Grupos e associações LGBTQIA+ em Portugal, como a ILGA Portugal, oferecem redes de suporte que podem ser fundamentais neste processo.
- Investir no auto cuidado
Priorize actividades que tragam bem-estar e satisfação pessoal. Exercícios físicos, hobbies ou práticas como ioga e meditação podem ajudar a aliviar o stress e reforçar a relação consigo mesmo.
- Procurar terapia especializada
O acompanhamento psicológico é uma ferramenta poderosa para trabalhar o luto, reconstruir a auto-estima e encontrar novos significados para as relações interpessoais.
Como a sociedade pode apoiar
A validação social é fundamental para ajudar pessoas LGBTQIA+ a superar o luto invisível. Promover um ambiente de aceitação, educar sobre as questões LGBTQIA+ e apoiar políticas inclusivas são passos importantes para criar um espaço onde ninguém se sinta sozinho ou rejeitado.
Uma mensagem de esperança
Superar o luto invisível não é fácil, mas é possível. Muitos que passam por este processo encontram novas formas de viver, mais alinhadas com a sua essência e rodeadas de pessoas que os amam pelo que são. Se está a enfrentar esta situação, lembre-se: a rejeição não define o seu valor. A sua existência é válida e merece ser celebrada.
Letícia David, Psicóloga