O meu amigo trans suicidou-se. Esta é a minha homenagem
Santiago tinha 30 anos e vivia numa cidade do distrito de Lisboa. A sua história de vida é igual à de tantos outros jovens: Depois de ter estudado e trabalhado em locais onde a discriminação imperou, decidiu voltar a estudar e a procurar trabalhos onde se sentisse melhor.
Santiago estava em fase de mudanca de sexo de feminino para masculino. No entanto, "desde que começou a transformação isolou-se mais e nem sequer procurava trabalho para não ser gozado", declarou Nicole, uma amiga do jovem. Segundo esta amiga o jovem transexual "passou por dificuldades para conseguir fazer todas as operações [...] e não aguentou a pressão, nem teve a ajuda que devia ter tido" disse Nicole ao dezanove.pt. "Sinto que já que não consegui ajudá-lo, mas que pelo menos ele seja um exemplo para ajudar alguém. E os familiares. Porque quando as pessoas estão desesperadas como ele, sem saber onde pedir ajuda, acabam por deixar pessoas para trás" lamenta a amiga. Santiago vivia apenas com a mãe, que apesar de "problemas de saúde e das dificuldades económicas sempre esteve do lado dele".
Lê a seguir o testemunho de Nicole que, num misto de revolta e homenagem, decidiu partilhar um texto com os leitores do dezanove.pt para que estas histórias não se voltem a repetir: "Para que outras pessoas não cometam o erro de acabar com a própria vida e percebam que não são os únicos a passar por isso":
"Em Portugal não há a ajuda médica necessária para ajudar quem nasceu no corpo errado. Nem sequer para ajudar alguém a perceber se realmente nasceu no corpo errado... Não há apoio psicológico suficientemente bom para isso.
O Santiago estava em fase de mudança de sexo feminino para masculino. Após uma cirurgia mal feita no peito, lá seguiu com o processo para tentar tornar-se quem ele queria ser. Só que entre depressões, preconceito e hormonas houve várias tentativas de suicídio pelo meio.
Mas o Santiago tentou andar para a frente e inscreveu-se num curso de cabeleireiro. Foi onde o conheci. Foi super bem recebido pela turma, todas tentamos apoiá-lo. Mas ele sentia-se sozinho e perdido. Passava dificuldades com a mãe para conseguir continuar com o processo [de reatribuição de sexo] e conseguir pagar consultas e tratamentos.
Ele tinha 30 anos e não conseguiu ver a luz ao fundo do túnel. Cometeu suicídio há três semanas.
Vamos combater o preconceito, lutar por melhor apoio médico, lutar para que quem como o Santiago estiver nesta situação não se sinta perdido no mundo e sem ajuda.
A quem estiver nesta situação: não se isolem, não são os únicos assim! Nunca desistam de lutar pela vida! A vida pode ser maravilhosa se não desistirem."
Nicole Ferreira
Importante: Se és alvo de bullying homofóbico ou transfóbico contacta as autoridades policiais em qualquer localidade ou recorre a alguma das seguintes organizações de apoio às pessoas LGBT:
APAV - Associação Portuguese de Apoio à Vítima - Rede Nacional de Gabinetes
API - Acção Pela Identidade
AMPLOS - Associação de Mães e Pais pela Liberdade de Orientação Sexual e Identidade de Género
Casa Qui - Associação de solidariedade social pela inclusão e bem-estar da população LGBT
ILGA Portugal - Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual e Transgénero
Linha LGBT - Linha Telefónica de Apoio e Informação LGBT
rede ex aequo - Associação de jovens LGBTI e apoiantes: geral@rea.pt
SOS Voz Amiga - um serviço de ajuda pontual em situações agudas de sofrimento causadas pela Solidão, Ansiedade, Depressão e Risco de Suicídio: 21 354 45 45, 91 280 26 69 ou 96 352 46 60.
Sugestões de leitura para mães e pais que perderam filhos:
APAV: O Luto por um Filho ou por uma Criança
Público: Sou uma mãe que também perdeu um filho. Queria dizer-lhe que ainda vai ser feliz"