O que tem a "Çenhoura" a dizer sobre as questões LGBT? (spoiler: entrevista chiquérrima)
A personagem mais chique da internet portuguesa (e bairros limítrofes) tem uma palavra a dizer, melhor, todo um eloquente discurso sobre a temática LGBT. Pela primeira vez na história (rectifique-se para História) a Çenhoura (aka Sinhora) d'A Criada Malcriada aborda questões íntimas e pessoais.
Nesta entrevista (imprópria para quem tiver menos do 10 minutos disponíveis), a entrevistada faz grandes revelações: vive com vinte mulheres em casa e foi casada três vezes com a Princesa Margarida. Quer dizer, não são bem revelações. A própria Çenhoura não tem bem a certeza disto. Também quisemos saber o que pensa A Criada e perceber se ela era mesmo malcriada, mas não conseguimos chegar à fala com a mesma (talvez esteja a caminho do Finalmente). Depois deste palavreado todo lê agora esta entrevista tirada a ferros (de engomar para passar as fardas e os vestidos comprados em Nova Iorque).
dezanove: É do seu conhecimento que no dezanove.pt abordamos a temática LGBT? Qual o seu posicionamento sobre os direitos de gays, lésbicas, bissexuais e transgéneros? "Nem menos, nem mais, direitos iguais"? (Onde ficam os direitos da Criada no meio disto?)
Çenhoura: Bom, agora já sei, já vi o site e adorei imenso. Um dia destes imprimo e depois leio. Oiça, vamos combinar uma coisa, que eu detesto essas palavras todas acabadas em ays, em ésbicas, em ais e em éneros. Diga “disso”. É o que eu uso sempre. Como em “A menina sabia o X é disso?” ou “Coitada da Y, que ainda não percebeu que o marido é disso” ou “Ela diz que vive com uma prima, mas acho são tão primas como eu sou prima da Dolores Aveiro, devem ser é disso” ou “Adoro fazer compras em Nova Iorque, encontro sempre, pelo menos, trinta amigos disso” ou “Quem lhe deixou a casa foi um tio, o conde, que era completamente disso”. Bom, acho que já percebeu a ideia. Os direitos. Adoro os direitos de toda a gente. Acho que toda a gente tem imenso direito, e não há direito de não terem. É o que eu acho. Pode haver outras opiniões, mas esta é a minha. Desde que os comunistas fizeram a Revolução Francesa, somos todos iguais. Só há é umas pessoas que andam mais arranjadas que outras. Olhe, por exemplo, os homens disso andam sempre estupendos. As mulheres disso, é assim um género que não faz tanto a minha linha, mas que sais-je? É melhor não pôr esta última parte… (Os direitos da Criada ficam exactamente onde o menino os pôs, entre parêntesis).
O seu bom gosto já marcou presença em algum casamento entre pessoas do mesmo sexo? Conte-nos tudo o que não fez.
Hoje em dia, não vou a casamentos. Aborrece-me de morte. As missas são chatíssimas, e essa moda nova dos casamentos civis são sempre numas conservatórias num terceiro esquerdo, ou segundo frente, sem elevador. Enfim, um chiquée… Mas deixe cá pensar se já fui a algum entre pessoas do mesmo sexo, ou seja pessoas disso… Olhe, primeiro, os casamentos quase nunca são “entre”. É aquela coisa que se costuma dizer: “A X casou”, “Ai, sim? Contra quem?”. É uma graça que eu adoro! Rio sempre imenso. Porque é que não se está a rir? Bom, adiante. Nos anos sessenta, lembro-me de umas festas em Mustique, que é uma ilha que há, onde eu própria, acho que casei três vezes com a princesa Margarida, que era uma princesa que havia. Mas lembro-me mal. Aquilo era tudo muito novo, e se calhar exagerávamos um bocado na dose. Credo, não escreva isso.
Desculpe a intromissão, mas a Senhora vive com outra mulher em casa... Não lhe vemos marido há muito tempo... O que lhe apraz comentar?
Olhe, apraz-me comentar que vivo com, pelo menos, vinte mulheres em casa. Não sei bem, nunca contei. Podem ser menos, que elas às vezes mudam de penteados e assim e baralho-me imenso. Agora se isto é uma fantasia erótica para alguém, é lá convosco. Eu acho um pesadelo.
E em relação à adopção de crianças por casais do mesmo sexo... Acha que só os casais heterossexuais merecem passar noites mal dormidas, aturar birras, limpar ranho, passar odisseias para comer o raio da sopa? Acha que falta muito tempo para que os gays portugueses possam dividir isto a meias e legalmente com os heteros?
Mas que raio de experiência com os filhos são essas? Eu a-d-o-r-e-i ser mãe! E já na altura era completamente a favor da adopção das crianças por criadas (do mesmo sexo) até, pelo menos aos oito anos. Ou até saberem comer à mesa. Ou até saírem de casa. Até essa altura, estão só um furo acima dos cães, com a desvantagem de nem sequer conseguirem ir buscar coisas. Se calhar, é melhor não escrever isto também, que vão pensar que sou um monstro.
(como podem ver a Çenhoura não é um monstro)
Se a sua Criada lhe dissesse que precisava de terminar o trabalho mais cedo a uma segunda-feira para ir actuar no Lugar às Novas do Finalmente (local onde se revelam as caloiras na arte do transformismo), como reagiria?
Só li até “dissesse” e já fiquei possessa!
No último Sábado, 20 de Junho, decorreu a Marcha do Orgulho LGBT de Lisboa. Esteve lá? As ruas de Lisboa estão um nadinha desniveladas, levou sapatos de salto alto vulgo tacões?
Querido, fui tanto à marcha como o menino foi ao Baile da Rosa no Mónaco. Não sou capaz de sair à rua em Lisboa. É tudo em cascalho, parece que estamos no século XIII. No Peru. E chamam-lhe chaussée portugaise para dar um ar mais ou menos civilizado, mas é uma coisa saída das trevas. Ainda bem que o Manuel Costa está a acabar com isso. Ou Francisco Costa. Bom, o Costa. Como é uma cidade pobrezinha, em vez de mármore, ponham tijoleira, que também é típico. Escorrega mais, mas não magoa tanto. Ou aqueles tacos miudinhos, que os pobres adoram. Ai, esta última frase não ponha!
E ao Arraial Pride no próximo Sábado? Vai? E vai deixar ir a sua Criada?
Adorava ir! A sério! Mas nesse dia vou partir uma perna! Se não, ia!
Os queridos, que são disso, que adoram ter umas casas a atirar ao palácio barroco, que só comem nuns restaurantes todos da mesma cor, com pratos em cama de não sei quê, que só se vestem nuns costureiros que há, que têm sempre uns cães a fazer pendant com a cor do cabelo, depois fazem umas festas chamadas “marcha” e “arraial”? Não contem comigo. É o mesmo que receber um convite do Truman Capote para o black and white ball no Plaza a dizer que é uma churrascada. Pensando melhor, não ponha nada desta resposta, que pareço um bocado disso-fóbica…
Com tantos candidatos à Presidência da República não está a pensar candidatar-se?
Estou. Vou aproveitar para fazer o anúncio da minha candidatura num site gay, que é para ficar logo queimada à partida. Brincadeira! Por acaso, adorava ser presidente da república, apesar de ser um nome sinistro. Parece um insulto. “Oiça lá, seu presidente da república!”. Por favor, não ponha isto, que acho que é crime.
Qual seria a sua primeira medida para o país? (Vá, duas... Pronto... Três.)
Naturalmente, mudar a residência oficial do Palácio de Belém para outro lado. É um cochicho, e num sítio péssimo. Passam imensos eléctricos à porta, e aquela chusma de gente para ir comprar aquelas custard pies que cá se acha que é uma coisa portuguesa. O mais provável era escolher um palácio nos arredores de Paris. Ou então, se fizessem mesmo muita questão, mudava-me para o palácio de Mafra, que é o único palácio que temos que é digno desse nome, com a desvantagem de… bom, de ser em Mafra. Risque esta parte que não quero nada receber hate mail de mafrenses, ou mafrinos, ou mafritas, ou lá como é que se chamam.
Quer intervir divinamente para ver se consegue agraciar os seus fãs do dezanove.pt com uma tira/desenho/obra de arte? Muitos estão todos 'molhadinhos' só de imaginar o que pode sair daí.
Vou fazer duas coisas: ignorar a última frase, e mandar-lhe dois retratos meus, que foram os únicos que encontrei que acho que têm a ver assim com os vossos temas. O primeiro, sou eu, acho que em 1972, com um vestido Pucci, que tem exactamente as cores da bandeira maric… da bandeira LGBT. O segundo, sou eu também, claro, com um YSL que não podia ser mais lesbian chic. Devem adorar, não é?
Por que decidiu abrir um "çaite", o http://criadamalcriada.com/ ? É NSFW?
Queria que eu abrisse o quê? Uma pastelaria na Amadora? Abri o site porque acho moderno ter um site. E para poder dizer: “Ai, sei lá! Vá ver ao site” ou “Não sei, já viu no site?” ou “Não me faça mais perguntas, vá ver ao site”. E também para fazer umas coisas diferentes, umas entrevistas a umas pessoas, umas crónicas onde falo sobre tudo o que me apetece. Mas, sobretudo, para vender t-shirts e ganhar imenso dinheiro. So shoot me.
Entrevista de Paulo Monteiro