O que é a Terapia Afirmativa de Género? 

As terapias afirmativas de género são um conjunto de abordagens psicológicas  que, em primeiro lugar, reconhecem a diversidade de género e orientação sexual como expressões naturais e saudáveis da experiência humana. Estas terapias rejeitam qualquer noção de “cura” ou “reversão” da identidade de género e sexualidade, e, ao contrário, focam-se em apoiar o indivíduo na sua  auto-aceitação, fortalecimento emocional e resiliência perante os desafios sociais  e pessoais. 

Este tipo de terapia é particularmente relevante num contexto onde a sociedade  ainda impõe normas rígidas e binárias sobre identidade e expressão de género.  Em Portugal, embora tenhamos avançado em questões de direitos LGBTQIA+,  ainda persistem discriminação, invisibilidade e micro-agressões que impactam a  saúde mental de muitas pessoas LGBTQIA+.

Porque é importante uma abordagem afirmativa? 

Estudos mostram que pessoas LGBTQIA+ enfrentam maiores taxas de ansiedade, depressão e outras dificuldades emocionais, muitas vezes devido à discriminação e preconceito experienciados na sociedade. A terapia afirmativa é uma resposta ética e profissional a estas vulnerabilidades, pois permite que as pessoas  explorem as suas identidades sem receio de julgamento ou pressão para se enquadrarem em normas que não correspondem às suas vivências. 

A terapia afirmativa é uma resposta ética e profissional.

Enquanto psicóloga, observo frequentemente o impacto positivo que um espaço afirmativo e acolhedor pode ter no processo terapêutico. A possibilidade de  expressar livremente dúvidas, inseguranças e experiências pessoais é um alívio  fundamental que reforça a auto-estima e o auto-conhecimento, factores chave para o bem-estar psicológico. 

Como funciona na prática? 

Na prática, uma terapia afirmativa de género segue algumas directrizes essenciais:

1. Respeito pela identidade do paciente: O primeiro passo é sempre o  respeito pela identidade apresentada. O terapeuta utiliza o nome, pronomes e expressões de género com os quais a pessoa se identifica,  promovendo um ambiente de respeito e aceitação. 
2. Exploração sem pressão: Muitas pessoas chegam à terapia com dúvidas sobre a sua identidade de género ou orientação sexual. A terapia afirmativa cria um espaço seguro para essa exploração, sem pressões para tomar  decisões apressadas, o que ajuda no desenvolvimento de uma identidade mais sólida e confiante. 
3. Enfrentar o preconceito e a discriminação: A terapia inclui a  compreensão e elaboração das experiências de discriminação, ajudando o  paciente a desenvolver estratégias de resiliência. Ao perceber que a  discriminação vem de fora e não da sua própria identidade, a pessoa tende  a construir uma auto-imagem mais positiva e saudável. 
4. Fortalecimento da rede de apoio: A terapia afirmativa também encoraja a  pessoa a procurar e construir uma rede de apoio positiva, composta por  amigos, familiares, colegas e/ou grupos comunitários que validem e  respeitem a sua identidade. 
5. Auto-cuidado e estratégias de bem-estar: Num contexto onde o stress e a  ansiedade podem ser realidades diárias, a terapia afirmativa foca-se em  promover técnicas de auto-cuidado e práticas de bem-estar adaptadas às necessidades de cada pessoa. 

Os benefícios da terapia afirmativa 

Para muitas pessoas LGBTQIA+, o acesso a uma terapia afirmativa de género  transforma profundamente a relação que têm consigo mesmas e com o mundo.  Esta abordagem ajuda-as a enfrentar e gerir os impactos de um ambiente social  frequentemente hostil, promovendo uma maior auto-estima, confiança e bem estar emocional. 

Num país como Portugal, onde, apesar dos avanços, as pessoas LGBTQIA+  continuam a enfrentar obstáculos, é essencial que o apoio psicológico se torne acessível e afirmativo. A validação da experiência LGBTQIA+ por parte dos  profissionais de saúde mental contribui para uma sociedade mais inclusiva e para  o desenvolvimento pessoal de cada indivíduo. 

A necessidade de profissionais de saúde sensibilizados 

Infelizmente, muitas pessoas LGBTQIA+ relatam ainda experiências negativas na  procura de ajuda psicológica, deparando-se com profissionais desinformados ou preconceituosos. Este desconforto pode levar a uma desconfiança no sistema de saúde mental, impedindo que a pessoa obtenha o suporte de que precisa. 

Daí a importância de investir em formação especializada para psicólogos e outros profissionais de saúde mental, para que estejam preparados para oferecer terapias afirmativas de género. Instituições de ensino e organizações profissionais  em Portugal têm a responsabilidade de incluir a diversidade sexual e de género nas suas formações, de forma a garantir um atendimento mais inclusivo e eficaz. 

Conclusão 

A terapia afirmativa de género é, acima de tudo, uma abordagem que respeita e  celebra a diversidade. Ela reconhece que cada identidade é única e que o bem estar psicológico depende, em grande parte, da aceitação e validação da nossa  

essência. Em Portugal, à medida que caminhamos para uma sociedade mais  inclusiva, é fundamental que o acompanhamento psicológico evolua também no  sentido da afirmação, oferecendo à comunidade LGBTQIA+ o espaço que merece  para se desenvolver e prosperar. 

Que esta seja uma reflexão para todos os profissionais de saúde mental e para a  sociedade em geral: reconhecer, apoiar e celebrar a diversidade é o caminho para um bem-estar colectivo e para uma vida plena para todas as pessoas. 

Letícia David, Psicóloga