Trump e o retrocesso mundial para pessoas LGBTQIA+
A reeleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos representa um retrocesso significativo para os direitos humanos, especialmente para a comunidade LGBTQIA+ e para a estabilidade política mundial. Durante o seu primeiro mandato, Trump teve várias políticas que tiraram protecção para pessoas LGBTQIA+, incluindo a proibição de pessoas trans no exército e o enfraquecimento de políticas contra a discriminação. Agora, a sua retórica volta a suceder-se, indo na mesma direcção, consolidando a sua agenda conservadora, o que infelizmente dá força e serve de inspiração para outros governos ultra-direitistas.
Trump teve várias políticas que tiraram protecção para pessoas LGBTQIA+, incluindo a proibição de pessoas trans no exército e o enfraquecimento de políticas contra a discriminação.
Na Europa, a ascensão da extrema-direita já́ é uma realidade preocupante. Em Itália, Giorgia Meloni adopta uma postura hostil em relação a direitos LGBT+ e à imigração, promovendo a sua visão tradicional e nacionalista da sociedade. Em França, Marine Le Pen continua a ganhar força, à custa de explorar o descontentamento popular para fortalecer a sua agenda xenófoba, no mínimo. Em Portugal, o crescimento da extrema-direita reflecte a normalização de discursos de ódio e a erosão de valores democráticos algo que há poucos anos pareceria impensável. Fizemos 50 anos de Abril, e, no entanto, parece que nos esquecemos do que isso significa.
A influência de Trump poderá́ consolidar estas tendências, legitimando políticas regressivas e enfraquecendo a União Europeia face a um mundo cada vez mais polarizado. A defesa dos direitos humanos e da democracia exigirá uma boa resposta firme para impedir que o avanço da extrema-direita destrua as conquistas sociais das últimas décadas. Mas a grande questão permanece: como? Sobretudo quando a esquerda parece perdida, desorganizada e sem uma estratégia clara para contrariar esta onda reaccionária, retrógrada, conservadora, tradicionalista e outros mais “istas” que deixo para a vossa imaginação.
A ascensão da extrema-direita na actualidade faz eco de um passado sombrio da Europa, onde regimes autoritários mergulharam o continente na opressão e na guerra... Estamos todos com uma espécie de amnésia global e colectiva? Estaremos a esquecer quem foi Adolf Hitler? O “líder” que instaurou um regime totalitário que perseguiu minorias, eliminou opositores e provocou entre 17 a 20 milhões de mortes? E italiano Benito Mussolini? Que impôs o seu fascismo, que restringiu a liberdade individual e promovendo uma ideologia ultranacionalista que custou entre 300.000 a meio milhão de vidas?
E em Portugal? António de Oliveira Salazar ainda diz alguma coisa a alguém? Durante décadas, governou impondo a censura, repressão política e uma sociedade assente no medo e no conservadorismo extremo... O analfabetismo e a pobreza perpetuaram-se sob o seu regime, e, embora não existam números exactos, a PIDE, as prisões, as torturas, a guerra colonial, a fome e a miséria marcaram um período negro da nossa história. Muitas vidas foram alteradas, destruídas ou radicalmente pioradas. Mas há quem ainda pense que era um bom gestor porque nos “enriqueceu”, esquecendo do quão pobres realmente éramos.
Todos estes regimes partilhavam um desprezo pelos direitos humanos e pelas liberdades democráticas, promovendo uma visão intolerante e autoritária da sociedade — exactamente o que vemos ressurgir com Trump e os seus aliados ideológicos.
Todos estes regimes partilhavam um desprezo pelos direitos humanos e pelas liberdades democráticas, promovendo uma visão intolerante e autoritária da sociedade — exactamente o que vemos ressurgir com Trump e os seus aliados ideológicos.
Temos a sorte de que a história serviu para nos ensinar que a queda destes ditadores abriu caminho para uma Europa mais justa e democrática. Agora, esse progresso está em risco. O crescimento de partidos e líderes populistas demonstra que a história pode repetir-se, e isso deveria preocupar-nos a todos – bem que me avisaram as professoras de história, mas talvez a maioria não tenha tido professoras tão conscientes.
A falta de memória, a falta de noção e a falta de conhecimento são perigosas: a normalização dos discursos de ódio e das políticas opressivas exige vigilância e resistência. Se não agirmos, a Europa poderá voltar a mergulhar num passado de repressão e intolerância. O problema é que essa ameaça já não está no horizonte — está à nossa porta. E isso assusta-me.
E por mais que nada saiba sobre política, atrevo-me a achar que o caminho da esquerda portuguesa passe por recuperar a ligação com a população, conectar-se com as classes trabalhadoras, desfavorecidas e com questões sérias para resolver. Aqui, a extrema direita portuguesa apesar do seu discurso demagógico e populista tem conseguido criar identificação, mesmo sem apresentar soluções. É aqui que a esquerda precisa de estar presente, das mais pequenas localidades e bairros, aos maiores, com uma linguagem simples, do povo e classe trabalhadora comum para o povo e classe trabalhadora comum.
É justamente na linguagem que acho que a extrema-direita ganha: usa frases curtas, directas, populistas, que ressoam e chegam facilmente. A esquerda, pelo contrário, tende a complicar a sua mensagem, com discursos mais técnicos e teóricos que não chegam a quem mais precisa. Há que simplificar, falar de forma clara e assertiva. Talvez mesmo “reproduzir” a forma que a direita tem feito: potencializando as redes sociais, ter uma forte presença digital, com uma estratégia de comunicação moderna, mas acima de tudo simples e eficaz, usando até mesmo multimédia curtas e informativas (imagem e vídeo) e respostas rápidas nas plataformas digitais.
Depois acredito que exista necessidade de responder às preocupações reais das pessoas, explorando temas sensíveis sem medo ou sem ignorar estas questões, nem responder com moralismo. Soluções reais para pessoas reais, resoluções concretas e credíveis, em temas como:
Custo de vida – onde, por exemplo, se deve focar para baixar preços de habitação (arrendamentos e compra/venda) e bens essenciais, onde a pessoa comum vê muito do seu rendimento alocado;
Segurança e Imigração – Criar políticas que desmistifiquem e desacreditem teorias populistas que se espalham, onde a direita age como o seu principal motor impulsionador dos ditos populismos fáceis de acreditar aos mais desinformados, assim como garantir que em vez de ser vista como um problema, se veja os seus benefícios e o quão contribuem para o pais.
Corrupção – Aqui é onde a esquerda deve ser mais inflexível para não dar espaço ao discurso de que “são todos iguais”. Há que seguir com foco no que acreditam e filtrar por estes valores as pessoas que fazem sentido estar.
À parte disto, acho necessário existir uma real união em vez da desfragmentação: A fragmentação da esquerda em várias forças políticas, muitas vezes em conflito entre si, enfraquece a sua capacidade de resposta. Em vez de se disputar espaço entre partidos, encontrem pontos de convergência e façam disso força para enfrentar a extrema-direita, que essa sim é o inimigo comum e onde o esforço de unidade faz todo o sentido, em vez de se apontarem dedos e aumentar fragmentações.
Questões como voto jovem/jovem-adulto, educação política e formação não devem ser descuidados. A desacreditação política sobretudo dos jovens acaba por afasta-los do voto e há quem o faça como se de um protesto se tratasse, acreditando no que lhes é alimentado e dito. Uma mentira dita muitas vezes passa a verdade. Contra isto, só a educação e formação podem ajudar. Há que falar dos tais temas sensíveis, como precariedade, rendas, ambiente, direitos sociais e humanos e outros que mencionei acima e que poderia enumerar. Há que combater a desinformação e o crescimento de discursos populistas.
Por último, não cair na armadilha da extrema-direita: não lhe dar palco reagindo a tudo, o que amplia a sua mensagem. Combater a extrema-direita, mas sem fazer dela o centro de tudo. E mais uma vez, foco nas soluções em vez de confronto, linguagem simples e directa, falando para a pessoa mais pobre do pais à mais rica.
E aqui, até faço mea culpa, porque o medo que me amedronta e me faz escrever este artigo de opinião talvez seja o mesmo de quem está à frente dos partidos de esquerda… Mas a estes partidos é pedido que se distanciem de medos e receios e que procurem soluções.
Eme Pimentel Santos