A confusão de ser bissexual
Existe uma cena na série “Sex and the City” que vive na minha cabeça de como os bissexuais são vistos. Essa cena perpetua todos os clichés associados a esta sexualidade. Confusos, promíscuos, objectos sexuais, “pré-fase” para assumirem-se como gays ou lésbicas… “The list goes on and on”.
Contudo, isto é só a ponta do icebergue. Para além de termos esses chavões associados à nossa sexualidade, também existe a parte visual.
Como mulher bissexual, vejo muitas vezes a minha sexualidade a ser questionada. Não só pelos factos que mencionei, mas também pelo meu aspecto. Somos pressionadas a ter um certo “look”. Um quanto masculino, o habitual “maria-rapaz”. As poucas vezes que somos retratadas nos media, somos representadas desta forma ou como uma fantasia para os homens hétero.
É uma questão que mexe muito comigo pois não existe representação suficiente para entender que uma pessoa bissexual pode ser alguém como eu, mais feminina ou uma pessoa perfeitamente comum.
No livro “Women Don’t Owe Pretty”, Florecen Given fala exactamente disto, de como lutou com a sua própria sexualidade porque nunca viu alguém bissexual que se parecesse com ela. E como ela, falamos de uma mulher cis branca, portanto imaginem o quão ainda é mais difícil vermos retratadas pessoas queer que sejam negras ou pessoas com deficiências.
Acredito que para a sociedade em que vivemos seja difícil encarar que uma mulher feminina como eu possa, para além de gostar de homens, gostar também de mulheres.
Porque ai de mim que me apresento de forma “girlie” não gostar de homens, não é? Aliás por que motivo iria vestir-me assim senão fosse para o “male gaze”? Para a satisfação do homem cis hétero? Porque existira eu, senão para isso?
Vivemos numa sociedade que é muito centrada no homem, no sistema binário, na heteronormatividade. Palavras complicadas, certo? A verdade é que crescemos com duas opções, ou és homem ou mulher, ou és hétero ou és gay. E ser gay não é assim tão bem aceite…
Portanto imaginem o que é ver uma mulher feminina que gosta de mulheres, ou um homem masculino que gosta de homens. É choque muito grande para a sociedade que quer colocar-nos numa caixa ou noutra. Nada pode sair fora daquele padrão/predefinição.
Até dentro da comunidade LGBTQIA+ não é fácil ser aceite. Existe muita bifobia.
Para além dos habituais clichés que mencionei, existe aquele que conceito que uma pessoa bissexual que sempre namorou com o mesmo género, como sabe que gosta do outro. Exemplo: uma mulher bissexual que sempre teve parceiros homens, como sabe ela que gosta de mulheres?
A sociedade tem de mudar a forma como acha que uma pessoa bissexual é. O mesmo se aplica dentro da comunidade LGBTQIA+. Não podemos dizer que somos inclusivos e que abraçamos todas as sexualidades e géneros, mas depois perguntarmos a uma pessoa bissexual como tem a certeza que o é, se nunca teve com um dos géneros, ou perguntar a uma pessoa não binária porque prefere ser tratada com um certo pronome se é não binária. Temos de respeitar o outro, e criar um espaço confortável para todes.
Temos de respeitar o outro, e criar um espaço confortável para todes.
Recentemente, olho para a forma como me apresento e de ter decidido a não mudar a minha aparência, como algo revolucionário. As pessoas precisam de ver mais pessoas como eu, uma pessoa bissexual, e verem que sou uma pessoa igual a elas. Simplesmente gosto mais de que só um género.
Sara Correia