“A Favorita”: a divina comédia feminina
1. É num festim de interpretações, ao som de música barroca, 17 coelhos, vários tiros a patos, descidas ao inferno e muito mais que acompanhamos a ascensão e queda de três mulheres, envolvidas num triângulo amoroso lesboerótico, numa típica história de amor, ódio, poder e ambição.
2. Sinopse: Inglaterra, início do Século XVIII, está em guerra com França. A doente Rainha Anne (Olivia Colman) ocupa o trono e a sua amiga mais próxima, Lady Sarah (Rachel Weisz), governa o país em seu lugar. Até que a sua prima Abigail (Emma Stone), uma aristocrata caída em desgraça, chega à corte e cai nas boas graças da rainha.
3. O filme “A Favorita” (2018, “The Favourite”) de Yorgos Lanthimos chega-nos como um dos favoritos aos Oscars, tendo recebido 10 nomeações ao todo, sendo as principais: Melhor Filme, Realização, Actriz Principal, Actrizes Secundárias e Argumento Original. Desde a sua estreia, no Festival de Veneza, em Agosto de 2018 – onde ganhou o Prémio Especial do Júri e a Taça Volpi para a interpretação de Colman –, que o filme tem arrecadado admiração, estranheza, elogios, nomeações e prémios. O seu favoritismo é claro e o filme faz jus às expectativas criadas.
4. O argumento do filme assenta num boato, não confirmado, mas sobejamente conhecido, de que a Rainha Ana da Grã-Bretanha teve um longo romance com a sua amiga de infância Lady Sarah Churrchill, Duquesa de Marlborough, e que estas cortaram relações após e devido à chegada à corte de Abigail Hill, mais tarde Baronesa de Masham.
5. Nenhuma das personagens, desde as protagonistas, às secundárias é simpática ao nosso olhar. Qualquer pessoa que veja o filme tem dificuldade em sentir empatia para com quem quer que seja que apareça no ecrã. Mas é este um dos grandes trunfos do filme. O que se estranha, entranha. E é com agradável deleite que se assiste a um autêntico espectáculo de interpretações.
6. Elas. As mulheres. Tudo aqui é sobre e a respeito daquelas três mulheres. A depressiva que substitui a ausência com comida e afecto a coelhos. A sedenta de poder que quer à força governar um país. E, finalmente, a que quer recuperar o seu status social custe o que custar. A tentativa de libertação destas mulheres é o que as motiva e que as condena. Deixando-as à mercê de uma divina comédia feminina onde o Inferno, o Purgatório e o Paraíso são um só numa sucessão interminável de luta, interna e externa, sendo que, o que lhes resta no fim é a expiação dos pecados.
7. Nem sempre o argumento, da responsabilidade de Deborah Davis e Tony McNamara, nos dá isto tudo e para termos tudo isto temos que arremessar umas quantas toranjas vermelhas a alguém. É aqui que está a falha deste Lanthimos? É bem possível. Visto que é o seu primeiro projecto sem a colaboração de Efthymis Filippou.
8. Apesar de o filme se encaixar na perfeição na filmografia de Lathimos é o seu filme menos estranho e por consequência mais acessível. Estará Lanthimos hollywoodizado? Não. Contudo, falta nesta sua película o exotismo que lhe era característico.
9. Conclusão: é, realmente, a não perder.
4 estrelas em 5
Luís Veríssimo