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Alan Turing, o herói homossexual perdoado

Winston Churchill disse: “Foi graças ao Ultra que ganhámos a guerra.” Ultra era a designação dada pelos serviços secretos britânicos às informações obtidas pela descodificação das mensagens da máquina Enigma trocadas entre as forças do Eixo durante a Segunda Guerra Mundial. Alan Turing foi o homem que criou uma máquina capaz de tal façanha, a Bombe. O historiador Sir Harry Hinsley considera que por tal motivo a guerra foi “encurtada em não menos de dois anos, provavelmente em quatro”.

Alan Turing nasceu em Londres em 1912 e desde cedo se destacou no estudo das matemáticas. Aos 24 anos, concebeu a Máquina de Turing, uma máquina hipotética capaz de executar qualquer computação matemática desde que representável por um algoritmo, e idealizou a Máquina Turing universal, tendo demonstrado que uma tal máquina consegue computar tudo o que é computável – algo válido ainda hoje.

Isto tudo significa que o trabalho de Alan Turing lhe confere dois reconhecidos títulos: o de herói de guerra e o de pai da computação moderna. Então por que motivo este nome nos é tão desconhecido? É que Turing foi precocemente afastado do seu trabalho, e da sociedade em geral, após ter sido condenado por homossexualidade, em 1952 (pela mesma lei que, 57 anos antes, havia condenado Oscar Wilde). No Reino Unido, o crime de “indecência grosseira”, termo que basicamente equivalia a homossexualidade, era penalizado com prisão ou castração química. Tendo podido escolher, Turing optou por esta última. A castração química consiste essencialmente na administração de hormonas femininas que conduzem à redução da libido e à impotência sexual. Dois anos depois da condenação, Alan Turing acaba por se suicidar (embora a sua mãe e o professor Jack Copeland, um especialista em Turing, considerem que a morte foi acidental).

Na Inglaterra e no País de Gales, a homossexualidade deixa parcialmente de ser considerada crime em 1967. O mesmo acontece posteriormente, em 1980 na Escócia e em 1982 na Irlanda do Norte. Só em 2003 é que a homossexualidade é totalmente descriminalizada no Reino Unido.

Após uma intensa campanha, liderada pelo programador informático John Graham-Cumming, o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, em nome do governo, apresentou um pedido de desculpas público e oficial pela “forma horrenda como [Alan Turing] foi tratado”. Isto deu-se a 10 de Setembro de 2010. No passado dia 24 de Dezembro de 2013 foi a vez da Coroa Real Britânica lhe conceder um perdão real a título póstumo. Por muito merecido que este perdão a Alan Turing possa ser, há uma questão que subitamente se torna pertinente: é menos merecido um perdão a todos os outros homossexuais tratados da mesma “forma horrenda”? Supõe-se que haja muitos ainda vivos.

 

Paulo Bernardo

2 Comentários

  • Ricardo Duarte

    O estado a través da monarquia concede-lhe um perdão?!?!?!?!?!? QUE HIPOCRISIA!!!!!!!!!!!!!! A meu ver, é o estado que lhe deve um perdão porque é o estado que está em falta. Graças ao grande contributo dele os aliados ganharam a guerra.

  • Nuno

    com certeza, creio eu, deve ler-se “foi a vez da Coroa Real Britânica lhe PEDIR um perdão real a título póstumo” no lugar de “foi a vez da Coroa Real Britânica lhe CONCEDER um perdão real a título póstumo”.