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Convivi com um ditador: traçando um perfil da extrema-direita (parte 2)

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Homofobia e Transfobia

Uma reportagem tímida sobre disforia de género passava na televisão, estávamos no início dos anos 90 e os direitos arco-íris deixavam muito a desejar. A repórter questionou um jovem de cabelo comprido, sentado num passeio:

– Gostavas de ser mulher?

– Eu adorava – respondeu, com um sorriso infeliz e o sotaque do Porto. 

O meu pai apresentava os punhos cerrados e fez um gesto para a televisão: «Nojento, nojento, maricas do caraças!» Eu não entendia a raiva que lhe saía da boca, embora notasse que, na sua opinião, sentir que havia nascido no corpo errado seria completamente reprovado, apesar de não ter lido textos sobre o assunto, nem conhecido a história de nenhum transgénero.

Uma reacção semelhante tinha lugar, quando um determinado deputado do PS, aparecia na televisão: 

– Só de saber que este gajo é paneleiro, dá-me um nojo, nem consigo olhar para ele.

Quem era aquele deputado? O que fazia? Que propostas tinha? 

Na altura, eu não sabia nada sobre ele e não ouvia nenhuma palavra sobre o assunto, da parte do meu pai.

Se houvesse alguma manifestação pelos direitos das minorias, principalmente se se tratassem de marchas LGBT, o meu pai soltava comentários efusivos:

– Deviam era ir trabalhar! Os meus impostos a sustentar esta corja…

Por outro lado, mesmo que a arruada não estivesse ligado a esses direitos, mas se fosse protagonizada por homens como Miguel Portas ou Francisco Louça, o discurso era sempre o mesmo: “Uns maricas, os guardas deram-lhes nos cornos, deviam era ter levado mais!”

Já se o assunto tivesse a ver com relações lésbicas, o tom ficava ligeiramente mais brando, apesar de extremamente lascivo: 

– Olha para aquelas tuas colegas, aos apalpões umas às outras, todas umas fufas – o sorriso assumia um esgar lambuzado, como se as repreendesse com a boca, mas apreciasse aquela brincadeira que ele próprio sexualizava, na sua mente, relembrando que eu era uma criança e ouvia tudo isto, sem qualquer tipo de contexto.

 

Continua...

 

Leonor Matos