Dás-me um abraço?
Um abraço é a forma humana mais perfeita que existe. Os corpos encaixam um no outro. Sentem o cheiro um do outro. O calor. A vulnerabilidade. O medo. Num abraço silencioso dizes absolutamente tudo, sem desperdiçar uma única sílaba. O que precisamos é de mais abraços. Algures no tempo, alguns de nós sentimos a fragilidade nos braços, sem que do outro lado tivesse existido um conforto. A comunidade LBGTQ+ precisa abraços.
Existe uma necessidade urgente em que existam mais abraços entre nós. É necessário começar por dentro. O ódio exterior já é garantido. Já lhe conhecemos de cor os insultos, os olhares, os encontrões. Lá fora, as pessoas mordem. Algures no tempo, alguns de nós, ou mesmo todos, deparámos de frente com esses dentes. Nem todos tivemos a força para nos defendermos. Mas, como é que eu posso esperar que as pessoas não mordam, se sinto dentadas à minha volta?
Dentro da comunidade LBGTQ+ existe discriminação, preconceito e ódio. Dentro da comunidade LBGTQ+ existe falta de respeito, para uns com os outros. Não podemos esperar compreensão fora do arco-íris, quando dentro dele não existe harmonia. A fotografia, a imagem, o corpo, são os primeiros a passar pelo julgamento dos juízes da aceitação. Muito peso, pouco peso, muitos pêlos, poucos pêlos, careca, óculos, baixo, magro, alto, são apenas alguns dos itens a preencher do formulário de perfeição. Demasiado feminino, demasiado masculino, encontra-se por preencher na secção personalidade. Contudo, a primeira pergunta do formulário é a mais importante. Inclusive é aquela que vai determinar se vale a pena ou não, continuar a preencher tantas secções, a idade. Existe uma métrica gay única e exclusiva, que em nada se assemelha à numerologia do comum dos mortais. Em idade gay, a partir dos 30 anos passaste para a segunda idade. És velho. Após serem analisados todos os formulários, os juízes da aceitação, têm a missão de etiquetar com rótulos, a testa de cada membro da comunidade. Existe um número tão elevado de categorias, quase quanto o número dos meus cabelos. Sendo que, já conheço o caminho mais rápido com duas auto-estradas paralelas frontais.
E depois vem a empatia. Ou a falta dela. Somos braços que gritam bandeiras de resgate de respeito, de defesa de direitos de igualdade e de amor. Somos olhos e somos bocas, que perante o “inimigo” defendemos a nossa existência e reclamamos o nosso poder. Contudo, dentro do arco-íris, quantas vezes virámos a cara? Dentro do arco-íris, quantas vezes julgámos ou nos vestimos com um sentimento de superioridade? Quantas vezes nos esquecemos, que o outro é como eu? Quantas vezes não percebemos que eu, para os outros, sou o outro? Quando vamos olhar para o outro, e incorporarmos em nós, que o outro merece respeito e resposta? Quando vamos olhar para o espelho e pintar um reflexo de que, aquilo que reclamo para mim, só estará disponível, quando eu o disponibilizar?
Todas as guerras começam apenas com uma palavra. Todas as lutas nascem dentro da nossa sala. Podemos começar a limpeza por nós. Cada um de nós, a qualquer momento ainda está a tempo de travar aquilo que eventualmente, se pode vir a transformar numa luta, numa guerra. As cores da nossa bandeira não servem somente para os olhos de julgamento dos ditadores que nos querem calar, esconder ou aprisionar. As nossas cores também são válidas dentro do arco-íris. Os conservadores erguem o grande livro e gritam que Deus fez Adão e Eva, e não Adão e Pedro. As nossas mãos gravam com força nas pedras duras das cidades, que Jesus Cristo disse apenas, amai-vos uns aos outros, como eu vos amei. Não colocou no email em anexo, a lista de condições para amar, nem todos aqueles que não fariam parte da mesma. Tendo ou não, existido há 2000 anos essa figura histórica, porque não aplicamos nas nossas cores, o mesmo conceito? A comunidade LBGTQ+ precisa abraços. Existe uma necessidade urgente em que existam mais abraços entre nós. É urgente abraçar o outro, antes que tudo isto se acabe. Da próxima vez que me vires, dás-me um abraço?
Peter Pina