Diário do Ladrão de Jean Genet
O escritor, poeta e dramaturgo francês, Jean Genet (1910-1986), em Diário do Ladrão, traz-nos a história de um homem sem rumo capaz de transformar a destruição em superação, do seu aprisionamento numa forma de auto-reflexão. De cariz autobiográfico, Diário do Ladrão, conta os périplos de Genet por uma Europa decadente, dilacerada pela fome, a miséria e o crime, no qual o autor decide, conscientemente, ingressar no submundo da marginalidade, violência e prostituição levando inúmeras vezes à sua detenção. É durante as suas diversas penas que Genet encontra na escrita a forma de se expressar.
Para perceber a obra, e o contexto específico de vida nela retratada, talvez convenha contextualizar o percurso de vida do autor. Genet nasce em Paris a 19 de Dezembro de 1910. Descendente ilegítimo de uma mãe trabalhadora do sexo que o abandona em criança, acusado injustamente de roubo com apenas 10 anos de idade, decide tornar-se ladrão. Assim, o autor passaria grande parte da infância e da juventude em instituições para jovens delinquentes. Na década de 1930, Genet iria viver em vários países europeus como ladrão, até que, em 1943, depois de ter cumprido uma pena de prisão por roubo, começa a escrever.
Os seus trabalhos refletem essencialmente as suas experiências na prisão, acabando por abordar temas como a prostituição e a homossexualidade. Temas que lhe sairiam caros pela transgressão que representavam à ordem e norma de uma Europa atravessada pelos fascismos. Não só esta mesma obra seria publicada clandestinamente (1949) como viria a ser posteriormente censurada. Recordaria, a título de exemplo, a sua famosa curta-metragem, Un chant d’amour (1950), marco histórico universal na luta pela emancipação sexual do cinema que, devido ao conteúdo homossexual explícito, seria banida do espaço público durante largos anos.
A poética dramática e marginal apresentada em Diário do Ladrão tem tanto de revolucionária - subvertendo a ordem moral, sexual e intelectual dominante da época – como de política – cujo requisito reside no reconhecimento da liberdade individual e sexual. Através de uma linguagem provocatória, Jean Genet, traz-nos o mundo do sexo e da pederastia, dos homossexuais e travestis, dos corpos, desejos e amores dissidentes que resultariam neste compilar de páginas.
Este livro mostra como a vida de ladrão leva ao nascimento do escritor. Como por meio da escrita, aquele mendigo que vagueia por uma Europa em guerra, se descobre enquanto autor e poeta. Reclamando uma autonomia e consciência livre de viver, Genet, encontra na marginalidade a fuga à obediência e ao padrão cultural. Encontra nos seus diferentes amantes, a glória e miséria das sexualidades dissidentes. Genet exibe neste livro a audácia de extrair do crime, da traição e da marginalidade uma beleza poética que o libertara da clandestinidade.
Editor: Editora Minotauro
Ano: 2022
278 páginas
ISBN 9789899124127
PVP: 16,20€
Daniel Santos Morais é mestre em Sociologia pela Universidade de Coimbra. Feminista, LGBTQIA+, activista pelos Direitos Humanos. Partilha a sua vida entre Coimbra e Viseu.