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Efeminados: ser homossexual, mas ter de lidar com a crueldade vinda da própria comunidade?

Foi recentemente criada uma página intitulada: “Sou/curto afeminado”, uma página dedicada a todos aqueles que, como se já não bastasse a hostilidade da sociedade pseudo­moderna, ainda têm que suportar a crueldade vinda da própria comunidade homossexual. A página do Facebook que fez a divulgação da criação desta página foi a “[Humor controverso] Bixa Depressão”, chamando atenção para o problema daqueles homossexuais que afirmam “”Não curto afeminados” no Grindr/Scruff/Hornet da vida” e perguntando “Quantas e quantas vezes você já viu a palavra “Discreto” sendo usada como elogio necessário para a “conduta gay”.

Não é a primeira vez que esta página confronta o paradigma do gay que não gosta de outros gays apenas, e só, porque são um pouco femininos. Este tem sido um tema que gera múltiplas linhas de pensamento mas, contudo, todas convergem para a ideia de que: Para se ser bem aceite na sociedade, um homem gay deve comportar-se sempre de acordo com o modelo de homem antigo e cheio de teias de aranha. Ou seja, sejam gays mas não sejam gajas. Aqui, já é bem fácil remarcar o paradoxo patente. Homofobia dentro da comunidade homossexual. A necessidade de exaltar o “Macho Gay”.

 

Não se pode igualmente ignorar o facto de que, foi graças, às bichas afeminadas que chegamos a uma actualidade que, embora imperfeita, concede uma maior liberdade aos homens que beijam homens (pois no fundo é disso que se trata). Na Europa são já muitos os estados onde duas mulheres ou dois homens podem casar-se. No caso da homoparentalidade, isso ainda é alvo de muitos tabus, no entanto, já muitos progressos foram feitos na nossa história recente. Tudo isto foi alcançado devido a um combate travado, entre os anos 70’s até aos 90’s, envolvendo a sociedade homopenalizadora e os apenas, e só, os gays que eram pura e simplesmente eles mesmos, apesar das adversidades do mundo. E do que trata esta autenticidade? Trata-se de firmeza e coragem (eu diria que isto é, já de si, é muito masculino) de homens e mulheres que pura e simplesmente não aceitaram os rótulos que a sociedade teima em usar copiosamente. Foi, naquela época, a coragem masculina presente em todos os homens e mulheres LGBT que nos trouxe ao ponto onde estamos hoje. Lá estavam certamente presentes as feminilidades do ser humano.

Todo o ser humano está algures num daqueles tons de cinzento, mas nunca, podem crer, nos extremos. Os extremos são conceitos teóricos ideais que não se verificam na realidade. E porque não? Pois somos (independente de ter um pénis e uma vagina na zona pélvica), a nível psicológico, simultaneamente homens e mulheres. Senão podemos recordar um artigo, anteriormente publicado aqui no dezanove.pt e, também o caso recente da Conchita Wurst. Portanto, temos aqui a forma científica e artística para expressar a diversidade humana e a sua misoginia e, trazendo assim aos olhos aquilo que compõem a alma humana.

 

Negar o feminismo é degradar uma componente da alma/espírito (ou seja lá o que for) de cada ser humano. Está na hora de perceber que os homens heteronormativos não são merecedores do alto posto que possuem e admitem como sendo seu por direito na sociedade. Está na hora da igualdade. Está na hora de valorizar a mulher que há em cada mulher e em cada homem também. Está na hora de viver num saudável respeito pela diversidade. Aqui a figura de um homem bonito que consegue ser uma mulher bonita e, de forma contrastante e chocante, possui uma barba, apenas é um pequeno gesto para dizer que o homem macho não vale mais que mulher nem a mulher vale mais que os homem. Está na hora de perceber que o homem macho é só mais um tom na palete dos tons de cinzento. Está na hora de pensar em unidade e com respeito pela nossa diversidade intraespecífica!

Ser mulher é mau? Por que motivo? Haverá aí alguma coisa a resolver? Certamente, sim. No entanto (e agora utilizarei uma citação da Bixa Depressão que partilho na integra), “Seu tesão não deve ser usado para divulgar seus preconceitos, até porque no amor não existe formulas e a gente sabe, a senhora gosta mesmo é de N-E-C-A !!!!” (podem procurar na internet o que neca quer dizer).

Sê gay! Deita-se com quem sentires que deves! Mas não discrimines outros seres humanos iguais a ti. Sê masculino, ou o que quer que sejas, mas admite o valor igualitário das formas femininas e masculinas. Só assim caminharemos para uma sociedade mais justa.

Citando a Bixa Depressão, “Seja fabulosa!”

 

César Monteiro

20 Comentários

  • Filipe

    Já me mandaram «dar uma volta» mais que uma vez por não ter barba nem ser peludo. «Tens cara de puto» ou «não és peludão»: foi o que ouvi. Lamentavelmente há uma sub-comunidade chamada bears onde muita gente exclui quem não tem «barba rija», peito peludo e músculos ou corpo entroncado. Se conhecerem uma criatura destas e não forem um super-macho latino, tipo um qualquer actor de cinema gay adulto dos anos 70 ou 80 (e agora de anos recentes: os actores mais populares do momento, na sua maioria, são todos muscle bears) então esqueçam.

    Quanto aos efeminados: é ridículo mas noto que há muito preconceito dentro da população gay. Afinal os gays deveriam ser mais tolerantes pois eles próprios ainda são alvo de muitas atitudes e comportamentos homofóbicos.

  • Anónimo

    Não concordo com este artigo, acho bastante tendencioso. Não apreciar uma determinada caracteristica não faz com que esta seja excluida no seu todo. Eu por exemplo não consigo sentir atracção por homens femininos, mas também não precisam de ser machos latinos nem ter pêlos à anos 80. Simplesmente aprecio essa caracteristica: masculinidade. É como quem ha-de preferir os morenos aos loiros. Não creio que isso faça de mim homofobico.

  • Anónimo

    Faço as palavras deste comentário minhas. Trata-se duma característica pessoal. Eu por exemplo, não me sinto atraído por loiros, não estou a discriminar alguém… não me vou obrigar a gostar de algo que não me sinto atraído, o mesmo se trata da masculinidade.

  • Luis

    Infelizmente tenho que concordar que existe efetivamente algum preconceito na comunidade LGBT, sobretudo ‘entre letras’, mas também entre gays. Mas não concordo com muito do que se diz no artigo.
    Em primeiro lugar, o facto de um gay não ser efeminado, não quer dizer que o faça porque considera que o certo é ser ‘discreto’ ou porque não tem orgulho na sua homossexualidade. Por um lado, pode ver-se ‘obrigado’ a isso por questões profissionais, familiares, sociais, etc. Por outro lado, pode simplesmente gostar de se vestir/ comportar de forma mais masculina.
    Para além disso, o facto de se gostar de homens mais efeminados ou mais masculinos, é sobretudo uma questão de gosto. Outra coisa diferente será se se ostracizar socialmente um gay, só por ser efeminado, ou por ser bear, ou por não se enquadrar em nenhum destes padrões, ou por não querer assumir-se, etc. Isso sim é que é discriminação!
    Não tenho absolutamente nada contra a criação de espaços (virtuais ou físicos) que promovam uma maior proximidade entre pessoas que tenham gostos +-similares, mas sincermante não tenho mesmo paciência para estas atitudes de separatismos e ‘rivalidades’.

  • Guilherme

    Só gostaria de deixar claro que o artigo não trata de preferências sexuais. Trata da discriminação que existe de homens ditos “efeminados” não só pela parte da sociedade em geral, mas também dentro da “comunidade” homossexual. ~

    São pessoas que continuam a sofrer e a ser marginalizadas por que têm “tiques” e “dão muito nas vistas”, pondo em causa a sua liberdade de identidade. Que não satisfaça os gostos de determinadas pessoas, é legitimo, que continuem a ser desvalorizados e desrespeitados é onde está o erro.

    Há uns tempos saiu numa noticia de um rapaz que foi de saias para a escola e foi suspenso por o fazer e o que reti melhor foi:
    “As mulheres podem andar de jeans e ter o cabelo curto, usar camisas e botas, porque não há problema em ser homem. Mas se um homem se apresenta de forma feminina, é degradante. Porque tu pensas que ser mulher é degradante.”

    Fica para pensarem.

  • Sérgio

    É muito real o preconceito que existe na comunidade contra quem é mais efeminado. O que é muito triste. Numa comunidade que tanto teve de lutar (e continua) pela tolerância e aceitação do resto do mundo, deveria ser exemplo dessa mesma tolerância. Mas acontece que não é!
    O que fazer? Talvez escrever sobre o assunto e discutí-lo seja um bom começo.

  • João Queiroga

    Obrigado pelo artigo César! Fantástico!

    Existe infelizmente na comunidade gay portuguesa muito preconceito. Ser “discreto” é idealizado, e efeminados são alvo de gozo. Esta situação e estes tipos de comentários apenas promovem ódio, fragilizam e dividem a comunidade e, claro, rebaixam aqueles que desafiam modelos tradicionais de género.
    Independentemente de gostos individuais, temos que respeitar e celebrar a diversidade da comunidade!

  • Carlos

    Compreendo o teu ponto de vista mas penso não ter sido essa a intenção do autor do artigo. Penso que a ideia é mais insugir-se contra aquele pessoal gay que não tem problemas de dizer alto e bom som “sou gay mas sou homem, não sou como essas bichas, que são piores que as gajas”. O ter maior atracção por alguém mais “masculino” ou “feminino” é perfeitamente legítimo e não (me) parece ser esse o tema do texto.

  • José

    Este artigo fala de uma realidade que muitos aqui tentam ignorar ou fingir não existir. O preconceito contra homens mais femininos existe sim, não se trata apenas de atrações físicas como muitos aqui tentam fazer parecer.

    Se já alguma vez algum amigo teu te disse “Não pareces nada gay” e tu ficaste um bocadinho feliz. Se alguém te disse “Eu contra ti e outros gays não tenho nada, só não gosto de bichas” e tu sentiste uma pontada de orgulho, isso por si só já é discriminação.

    Porque no fundo, como já alguém disse aqui, o problema base é o sexismo. Ser mulher é mau. Ser melhor é inferior.

  • André

    Eu acho que a questão aqui também reside nos limites da feminilidade e masculinidade. E o que me chateia mais é a hipocrisia associada a pessoas que usam estes termos dirigidos a outras pessoas de forma depreciativa, quando eles próprios encaixam na percepção de “efeminado” de muita gente, incluído na minha.

    Em relação ao argumento de que é uma questão de gostos. Posso não gostar de efeminados mas tenho é de respeitá-los. É verdade que as coisas acontecem assim, mais ainda que inconsciente, o que está por trás é um processo de construção social daquilo que eu quero para mim, e do meu status.

    São questões de ego e de inseguranças e por isso limitamos os nossos próprios desejos baseados em preconceitos enraizados e resultantes da nossa educação. Posso dizer que não gosto de gordos. E legitimo este argumento não o chamando de discriminação mas sim como preferência. Mas a realidade é que estes preconceitos (pré-conceitos) não são reais! Ou seja, não é verdade que não gosto de gordos ou que não gostos de efeminados. Se o meu namorado é magro, caso-me com ele, amo-o e ele entretanto fica gordo, não vou acabar com ele. Ou seja, afinal gosto de gordos! Tenho é uma ideia de um ideal de pessoa que encaixa naquilo que é socialmente mais aceite pela sociedade.

    Portanto as pessoas que dizem que não gostam de efeminados, estão-se a enganar a elas próprias. Apenas estão a limitar-se da possibilidade de amar/relacionar com esses efeminados!

  • Filipe

    Acredito nisso mas tb eu não gosto de homens “tipo macacos”… e prefiro rapares kuase sem pêlos… tens face? curtia te conhecer melhor.

  • André O.

    Efetivamente ninguém nega a realidade da existência da homofobia internalizada e compreendo a ideologia deste texto. Contudo, quando a questão é transportada para o plano da atração física não há forma de controlar, é um pouco como gostar de homens em vez de mulheres ou gostar de morenos em vez de loiros. Particularmente, do ponto de vista do meu “ideal de homem atraente” prefiro loiros, mas já me apaixonei por morenos e a maioria dos meus amigos é moreno e não os discrimino por isso. O mesmo sucede com a característica referida no texto. Prefiro homens masculinos, tenho vários amigos mais femininos com quem mantenho otimas relações mas não me sinto fisicamente nem sexualmente atraído por nenhum porque essa característica, pessoalmente, não me é apelativa. Haverá certamente outros que a valorizam. Estes ideais de atração são inerentes a cada pessoa e não significam qualquer tipo de discriminação. Também não me sinto atraído por mulheres, não quer dizer que as discrimine. Similarmente não me sinto atraído por homens mais novos que eu, e a maioria dos meus contatos sociais são da minha idade ou mais novos. Acredito na diversidade de formas de ser e de estar como potenciais enriqueçedores da comunidade homossexual e do ser humano em geral e é precisamente graças a essa multi-diversidade de características em iteração umas com as outras que surgem aquelas pessoas especiais pelas quais nos apaixonamos. Assim sendo, não nego a possibilidade de me apaixonar por um moreno, um asiático, um efeminado ou mesmo uma mulher mas, efetivamente, estes não são os meus padrões de atração. E a atração, é algo que se sente e não se escolhe nem se controla. 🙂

  • David

    Ao analisar com cuidado o assunto conclui-se que o preconceito acerca do feminismo não tem que ser especialmente censurado entre homossexuais; como, aliás, sugere o artigo.

    Note-se, que aqui, parte-se do pressuposto que quem faz parte da comunidade homossexual possui esta característica. Porém, e dado que nenhuma orientação sexual implica determinado tipo específico de maneira de ser ou estar, o preconceito para com o feminismo não é um preconceito para com a “própria comunidade” mas de um indivíduo, seja de que orientação for, para com um dado traço distintivo da personalidade.

    Logo, o facto de um gay julgar o feminismo não quer dizer que rejeita a sua natureza, que em nada diz que tem que ser feminino, simplesmente deprecia quem é feminino; do mesmo modo que se critica um qualquer outro valor ou postura.

    Se o preconceito para com esta característica, que é o feminismo, tem fundamento? Não, e aí apoio-me no que o artigo fala, deve-se “admitir o valor igualitário das formas femininas e masculinas” e “viver num saudável respeito pela diversidade”. “Está na hora de pensar em unidade e com respeito pela nossa diversidade intraespecífica!”

    Sabe-se que qualquer natureza do preconceito vai contra o que é ou deve ser moral e eticamente correto.

  • CarlosHReis

    A questão primordial é não haver discriminação nem hostilização de ninguém, e ponto final! Eu sou gordinho, o que me incluiria automaticamente numa “linha” bear, contudo nem tenho muitos pêlos, e já fui muitas vezes eu discriminado por esta facção mais afeminada, por ser gordinho! Daí eu ser totalmente contra qualquer tipo de discriminação – de fora e dentro da comunidade! Como diz o meu pai: “A minha liberdade acaba onde começa a tua e a tua acaba onde começa a minha!”

  • Namorado

    Acho que o artigo apenas quis chamar a atenção é que mesmo entre os gays há discriminação. Nós apontamos os dedos aos “nossos”, e não gostamos que os “outros” nos apontem como gay. Isto chega a uma altura que temos que perceber que estamos de um lado da barricada e que somos iguais independentemente da maneira que somos. É como diz o slogan “tudo diferentes, todos iguais”, sabendo porém, que juntos somos mais fortes. E obviamente que todos temos os nossos gostos pessoais.

  • Gramática

    E o português? Já o aprendiam a escrever. Por favor dezanove. Sejam bixas mas não sejam burras, como dizia a grande Nany Petrova.

  • Diogo

    A natureza humana é cruel e enquanto houver humanidade haverá crueldade. Vinda das entranhas daquela e infestando tudo e todos à sua volta. Apenas pode-se tentar limar as imperfeições morais mais abjectas do comportamento humano. É preciso olhar além da aparência mas ninguém quer se dar a esse trabalho. O que conta é o que se diz, o que se mostra, o que se tem.