A importância do feminismo para os homens e o seu papel no movimento.
O feminismo existe como movimento de combate ao machismo, e o machismo existe porque existe quem acredite na superioridade do sexo masculino em relação ao sexo feminino. Se queremos atacar o problema da desigualdade de género na sua raiz, não podemos esquecer o papel do sexo masculino no movimento feminista, assim como a importância e benefícios do movimento para os próprios homens.
Como pessoa do sexo masculino, e como homem cisgénero, cresci a ouvir “Faz-te homem!”, “Pareces uma menina a chorar, homem não chora!”, “Não podes vestir cor de rosa porque é cor de menina!”, “Não sejas coninhas!” (até o órgão genital feminino é utilizado como forma de insulto e fraqueza), tudo isto tem um nome: masculinidade tóxica. Além do discurso ser extremamente machista e denegrir a Mulher, incute-nos, aos rapazes, valores de masculinidade completamente estereotipados e tóxicos que não só nos afectarão a nós como a quem nos rodeia, para o resto das nossas vidas — a não ser que sejamos capazes de os desconstruir.
Não é por acaso que a taxa de suicídio é significativamente maior no sexo masculino do que no sexo feminino, como nos mostra o relatório da Organização Mundial de Saúde (2019) sobre o suicídio. A inibição das emoções, o medo de ser rotulado de “fraco” ao mostrar sentimentos, receios, dúvidas e anseios e a ideia de que a transparência e a vulnerabilidade são características femininas, são narrativas perpetuadas pela masculinidade tóxica em sociedades machistas e patriarcais que explicam a grande taxa de suicídio do sexo masculino e que nos mostram os perigos deste tipo de educação tóxica.
Mas afinal, o que é que os rapazes e homens podem fazer para se livrarem destes estereótipos enquanto, simultaneamente, lutam contra as desigualdades entre géneros? Bem, um grande passo seria abraçarem o feminismo. Os homens (nomeadamente os homens cisgénero) são os maiores perpetradores de comportamentos machistas e de violência contra mulheres. Ao abraçar o feminismo, ao educarmos rapazes para crescerem como homens feministas, estamos a educar as futuras gerações na base do amor, da igualdade e do respeito perante a diferença. Para que isto aconteça, é fulcral reconhecer o privilégio masculino — tal como temos de reconhecer o privilégio branco para lutar contra o racismo. O Homem precisa reconhecer o seu privilégio masculino, desmantelá-lo e, finalmente, reconstruir-se como ser humano.
O Homem precisa reconhecer o seu privilégio masculino, desmantelá-lo e, finalmente, reconstruir-se como ser humano.
No livro de Jens van Tricht intitulado “Feminismo é bom para os homens”, o autor afirma que o feminismo não se resume a melhorar a qualidade de vida das mulheres, mas também a libertar os homens (e todxs, no fundo), dos estereótipos opressivos que nos incutem desde o nascimento. Para os homens, o feminismo pode servir de inspiração para melhorar relacionamentos — sejam amorosos ou de qualquer outra natureza —, tornando-os mais justos, igualitários e cooperativos, assim como ajuda a criar uma maior partilha de responsabilidades e tarefas, muitas vezes estereotipadas como “femininas”. Finalmente, o feminismo contribui também para a redução dos vários tipos de violência contra as mulheres.
A participação e apoio dos homens no movimento feminista ajuda no fortalecimento do mesmo. Isto não significa que os homens assumam uma voz mais importante do que a das mulheres dentro do movimento, muito pelo contrário: é ajudar à luta e ajudar a dar voz a um sexo que tem sido, década após década, silenciado: o sexo feminino. Além dos vários tipos de activismo feminista possíveis, deve-se destacar o importante papel dos homens ao desafiarem comportamentos machistas de outros homens, sejam familiares, colegas ou amigos, seja chamando a atenção para um piropo, seja denunciando um crime de violência de género levada a cabo por outro homem, apoiando a vítima (ou sobrevivente).
Deve-se destacar o importante papel dos homens ao desafiarem comportamentos machistas de outros homens, sejam familiares, colegas ou amigos, seja chamando a atenção para um piropo, seja denunciando um crime de violência de género levada a cabo por outro homem, apoiando a vítima (ou sobrevivente).
No livro “Sejamos todos feministas”, a autora feminista nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie afirma que os homens precisam de entender o feminismo para poderem intervir em situações de micro-machismos, em que acontecem várias diferenciações baseadas no género. A autora também afirma acreditar numa mudança da cultura de subordinação feminina em que vivemos há séculos para uma cultura e sociedades mais igualitárias, visto que a cultura está em constante transformação. Chimamanda termina a sua obra com a frase “A meu ver, feminista é o homem ou a mulher que diz ‘Sim, ainda existe um problema de género hoje em dia e temos de resolvê-lo, temos de melhorar’. Todos nós, homens e mulheres, temos de melhorar”.
O papel do Homem é lutar contra a objectificação da Mulher; é reivindicar a liberdade de expressão e lutar pela igualdade salarial e de oportunidades; é impor-se perante o seu privilégio injusto baseado no seu sexo e género; é ajudar a dar voz a milhões de mulheres silenciadas todos os dias; é desafiar comportamentos abusivos, mesmo que não sejam a vítima direta; é falar perante situações e comentários machistas; é, no fundo, entender que o feminismo não é um movimento contra os homens, mas a favor da igualdade.
O feminismo não é um movimento contra os homens, mas a favor da igualdade.
É importante entender que o feminismo não é uma luta entre sexos. Os homens e as mulheres têm de entender que o feminismo é uma ideologia inclusiva, humana e interseccional. O Homem tem de compreender que o seu papel na sociedade tem de ser muito mais do que existir num ambiente tóxico e ignorar essa toxicidade. Defender os direitos das mulheres é uma questão de defender os direitos humanos, cujo interesse é de todxs.
Dito isto, é importante rematar com o básico: o lugar de fala no feminismo vai ser sempre da Mulher. A Mulher é a principal vítima do machismo e das sociedades patriarcais, é o sujeito que sofre, diariamente — directa ou indirectamente —, vários tipos de violência de género. A voz deve, e tem, de ser da Mulher, mas isso não significa que o Homem não desempenhe um papel crucial no desmantelamento dos vários tipos de ódio de género, ajudando a combater um problema cultural e estrutural de forma mais eficiente. Juntxs somos mais fortes.
Diogo Melo Ferreira, feminista interseccional, anti-fascista e anti-racista
Um Comentário
Amigo
Me parece ter havido uma certa “confusão” atrelando ao feminismo a definição de feminilidade! Feminismo e Machismo, são “perfis” que afastam a boa convivência entre as pessoas! Já ouvi de marido ou namorado, dificuldades de terem vida conjugal, porque Não é raro, mulheres que “definem” como requisito a se posicionarem no Mercado de Trabalho, serem 24 horas “competitivas” com os homens e, ai na cama acabam não relaxando! Noutra ponta, já teve homem que depois de relatar como era o relacionamento conjugal dele, alegar “carência” e minha sensibilidade em ouvi-lo, acabamos tendo relação sexual e, me penetrando e me observando, ao que disse a ele: sou homossexual, do mesmo gênero que tu, poderia até ter te sugerido sexo oral, mas que ele Não fosse machista em de repente ter imaginado que eu poderia ser um excelente assessor dele (profissionalmente) pelo desempenho sexual que ele demonstrou ter, já que muitos homens – especialmente – gerentes se definem competitivos por tal desempenho. Finalizei pedindo que ele Não confundisse feminismo/machismo com a feminilidade que tenho (mesmo que velada) ao conversar assuntos comportamentais!