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Vivemos segundo um modelo social que privilegia as relações heterossexuais. Relações que estão assentem nos papéis binários de género, na monogamia e na procriação. A esse modelo chamamos modelo heteronormativo.

A sua promoção é de tal forma bem-sucedida que são poucas as pessoas que desafiam os seus pilares. Muitas nem chegam a perceber que existem formas de viver alternativas. 

Ao recusar a heterossexualidade compulsória, a população LGBTI+ é uma das minorias desafiadoras do modelo heteronormativo. Sendo sabido que, por essa recusa, tem sido historicamente marginalizada. Não obstante, nas últimas décadas, graças aos movimentos LGBTI+, começa a existir na sociedade uma crescente tolerância para vivências não heterossexuais. 

No entanto, na minha perspetiva, essa tolerância só acontece para quem sustenta, quem reproduz as restantes normatividades, nomeadamente o binarismo de género, a monogamia e a procriação. A aprovação do casamento entre pessoas do mesmo sexo e da adopção de crianças, a procriação medicamente assistida são um bom exemplo disso mesmo. Quem incorpora a lógica heteronormativa está a tornar-se socialmente aceitável.

O homem branco, heterossexual, casado, com filhos, de classe média que materializa o privilégio heteronormativo. Na população LGBTI+ assume a figura do homem gay, branco, urbano, casado, adotante e com poder de compra. À reprodução das dinâmicas heteronormativas pela população LGBTI+ chamamos homonormatividade. Esta acaba por validar/reforçar o próprio modelo heteronormativo, pois ao replicá-los reconhece os seus pilares como naturais e fundamentais à sociedade.

É certo que o reconhecimento legal das vivências normativas da população LGBTI+ foi sem dúvida importante para assegurar os direitos dessas pessoas. Porém, quem se afasta da normatividade continua a ser altamente discriminado. O homem gay, imigrante, negro, activista queer e precário. A mulher lésbica não monogâmica que não se revê na maternidade. A mulher trans com expressão de género não binária. São sujeitos que continuam a ser vistos como uma preocupação, uma ameaça ao bom funcionamento social.

Pergunto-me se será esta a sociedade que queremos? Onde existam pessoas socialmente aceitáveis (hetero e homonormativas), e outras marginalizadas, por terem vivências alternativas à norma? Acredito que não. Uma sociedade realmente igualitária e inclusiva tem de ser um espaço seguro e saudável para todos. 

É por isso essencial criar espaço social para as pessoas que não encaixam no ideal normativo. Uma maior representatividade destas pessoas vai fazer com que sejam menos discriminadas e também possibilitar que outras consigam visualizar alternativas ao modelo normativo.

Para uma sociedade realmente inclusiva o foco ativista deverá ser o da desconstrução dos pilares da normatividade. Contestar a noção de norma e de normalidade. Chamar a atenção para a violência da ordem hegemónica. Isto porque a homonormatividade pode ser tão opressora quanto a heteronormatividade.

 

Daniela Alves Ferreira