Pausa para não generalizar
Local: Aeroporto de Lisboa
Data: 25 de Dezembro de 2024
Uma família de duas mães e duas crianças estão prontas para passar a segurança e dirigem-se para o corredor da prioridade. Uma delas leva o bebé no marsúpio, a outra leva a criança pela mão. Ambas levam a camisola que receberam na véspera de Natal (ugly Christmas sweater) – uma peça de roupa personalizada, com os nomes de cada membro da família e as suas caras em formato animado.
Assim que se aproximam de um membro dos serviços do aeroporto, uma jovem mulher que se encontrava a encaminhar as famílias de mobilidade reduzida, questiona a idade da criança.
– Ela tem três anos.
– Então, só uma de vocês é que pode passar.
– Mas nós somos uma família.
– Se fossem uma família de treze, não podia deixar passar toda a gente.
O casal de duas mães mostra-se confuso, alegam que já tinham passado naquela porta antes e que tinham ido juntas, com as suas crianças. Uma delas acrescentou que amamentava e que não poderia separar-se do bebé. A funcionária estava irredutível, até que um dos membros do casal referiu as palavras mágicas:
– Nós somos casadas, somos duas mães.
A jovem mulher desfez-se em desculpas, visivelmente envergonhada, foram minutos perdidos e tensão acumulada, o que poderia ter sido evitado se tivessem começado por dizer o mais óbvio. Nisto da diversidade, temos de começar logo pelos factos, dizer logo que se tratam de duas mães, que fizeram FIV, com recurso a dador, de preferência colar a certidão de casamento na camisola, visto que as camisolas feiosas de Natal, com a sua família estampada, não são suficientes. Convém ser muito específica, porque dizer «somos uma família» fica muito aquém das expectativas de quem trabalha num aeroporto.
Vamos esperar que mais famílias homoafectivas viajem a partir do aeroporto, para que se transformem numa realidade mais visível e gritante, de forma a evitar transtornos futuros.
Márcia Lima Soares
Instagram: marcialimasoares_