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Sara Tavares - de braços abertos

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Estou numa sala de espera e da rua chega-me a voz de Sara Tavares, a consternação generalizada repete as suas canções na rádio e nas nossas casas e é impossível não me transportar até 1994, para assistir à sua maravilhosa interpretação de Whitney Houston.

 

Quem diria que a Sara só tinha 15 anos? Na época, toda a gente sabia que ela venceria a final e as crianças brincavam no recreio, com microfones a fingir, imitando-a. Eu tinha 10 e sonhava com a minha ida ao programa «Chuva de Estrelas», que terminou antes de eu ter idade para participar. Numa festa de Natal, em 1999, resolvi cantar, sem qualquer acompanhamento, «Longe do Mundo», tentando copiar a sua versão para o filme da Disney, «Corcunda de Notre Dame». Desafinei que me desunhei, cheia de ego e lamentando não ter nem um terço da sua voz. Foi aí que me convenci de que não era soprano e que me manteria nos graves.

Em 2005, ia para a faculdade transportando o meu leitor de CDs, e ouvia o seu «bom feeling», relembrando o concerto gratuito, de 18 de março do ano 2000, oferecido por ela, em Oeiras – inegável talento, simplicidade, comunhão com os presentes, eu tinha acabado de fazer 17 anos, vinha de uma directa e sentia-me totalmente assoberbada pela sua voz e pelos instrumentos que a acompanhavam. O palco era a sua plataforma, o berço da maior estrela de todas.

[19 de Novembro, hospital da Luz, neoplasia no cérebro: estas mortes, principalmente as prematuras, esvaziam-nos a alma, roubam-nos as referências, embora nos alumiem as memórias. Agarramos no tempo com as nossas mãos e desfiamos os seus fios até chegar ao ponto em que as canções da Sara amparavam os caminhos que deixámos para trás. Depois vem a vergonha em admitir que choramos por quem não chegámos a conhecer. Chora-nos a alma de um Portugal ferido, de uma cultura em convulsão.]

Muito, muito mais tarde, alguém me disse que a Sara Tavares tinha afirmado ser bissexual. E isso importava? Para mim importou, acredito que foi igualmente importante para outras mulheres, que se sentiam invisíveis e apontadas ou questionadas pela sua orientação sexual. Afinal de contas, era a Sara Tavares, do alto do seu cabelo frisado, empoderada de bondade, descendente de cabo-verdianos, portuguesa de Almada, Margem Sul, onde habita Jesus. Que a sua voz jamais nos permita baixar os braços. 

Márcia Lima Soares