“Sodomita” de Alexandre Vidal Porto
Editado pela Tinta da China, “Sodomita” é o quarto romance do autor brasileiro Alexandre Vidal Porto. O livro dramatiza o processo judicial do português Luís Delgado, uma personagem real do século XVII, acusado de práticas sexuais com outros homens. A acção tem lugar no Brasil colonial, para onde Delgado é desterrado, e onde volta a reincidir no “vício” a que não consegue escapar.
Os arquivos do Tribunal do Santo Ofício, vulgo Inquisição, são ricos em informação sobre os comportamentos tidos por desviantes. Vidal Porto recorre a esses elementos para traçar a história de um homem condenado em 1669 pelo crime de sodomia. Essa primeira ofensa é praticada em Lisboa, capital de um vasto império colonial, numa altura em que era comum o recurso ao degredo para os territórios ultramarinos como pena criminal. É o que vai acontecer a Luís Delgado, violeiro que se envolve carnalmente com um jovem do sexo masculino, e por essa ofensa é enviado para a cidade de Salvador da Baía, no Brasil.
Em estilo de linguagem, o livro de Vidal Porto inspira-se nos processos da inquisição para tecer a biografia de Luís Delgado, caso que já tinha sido estudado antes pelo historiador Luiz Mott. O recurso às fórmulas linguísticas da época e ao discurso deste tipo de documentos processuais define o programa estético e dramático do romance. É sempre através do olhar e da pena do inquisidor que conhecemos as paixões, as cedências ao pecado e os infortúnios de Delgado. É também esta perspectiva que confere especial interesse ao livro, transportando o leitor, não apenas para aquela época histórica, mas para os arquivos da Inquisição.
“Sodomita” oferece um olhar sobre a homossexualidade na Idade Moderna, longe ainda de esta palavra existir, mais longe ainda de ser envergada como bandeira identitária. Não obstante, somos confrontados com diferentes matizes de aceitação/perseguição. No Brasil colonial, território de encontro (forçado) de culturas – europeias, ameríndias, africanas –, o “vício” de Delgado oscila entre o «é da nossa natureza», assim considerado pelos escravos que coabitam com o protagonista, e motivo de ira divina, o que instiga a caça religiosa promovida pelo arcebispo da cidade.
Sendo amplamente praticado entre indivíduos de diversas proveniências, apesar de nunca abertamente mencionado entre a sociedade respeitável da capitania, o que faz perder Delgado é a sua pretensão a viver “maritalmente” com outro homem. Se se condescendia com os furtivos encontros sexuais desta classe de degenerados, o que não se podia tolerar era o amor entre dois homens.
ISBN: 9789896718763
Editor: Tinta da China
Data de Lançamento: Outubro de 2024
Páginas: 136
Pedro Leitão