Há dias disseram-me que arrisco entrar com a escada toda dentro da Igreja Católica, que recuso subir degrau a degrau, que entro com a minha comunidade sentando-me na fila da frente com os olhos a brilhar – o Cristianismo é dxs marginalizadxs, dxs prostitutxs, dxs pobres e dxs que sofrem. Não me dêem menos que isto, não aceito outra Ceia.
E o que é isto de teologia queer? Nada mais nada menos que um método teológico desenvolvido a partir da abordagem filosófica da teoria queer e que teve como pioneirxs Marcella Althaus-Reid. A teologia queer pretende abrir caminhos para que a sociedade assente no princípio de igualdade e que em Cristo, o amor seja vivido pelas pessoas na qualidade única de amor.
Parte-se da ideia de contradição entre a vivência que uma pessoa tem de si própria em relação a Deus e a imagem de Deus que recebeu, por exemplo; uma pessoa queer que se pode considerar aceite por Deus e ver-se simultaneamente a par com uma interpretação teológica normativa de condenação da sua orientação sexual.
Os perigos destas interpretações teológicas podem implicar um afastamento dx crente e causar uma repressão violenta da sua própria perspectiva. Como é que se resolve esta contradição? A solução passa pela mudança de percepção da pessoa sem que esta se violente e autorreprima, ou seja, entenda sobretudo que o texto bíblico foi escrito sob inspiração de Deus mas com filtragem humana; tudo aquilo que se apresenta como discriminatório não corresponde necessariamente à vontade de Deus uma vez que o conjunto de livros que compõe a bíblia deve ser interpretado no seu contexto e à luz das suas limitações.
Estamos perante uma teologia crítica que procura alternativas às interpretações vigentes que geram discriminação e exclusão e que são motivo de afastamento e perda de fé da comunidade LGBTQIA+.
Estamos perante uma teologia crítica que procura alternativas às interpretações vigentes que geram discriminação e exclusão e que são motivo de afastamento e perda de fé da comunidade LGBTQIA+. A postura tomada pela teologia queer é de um enfrentamento disruptivo para com a teologia dominante – entrar com a escada toda! Reclamar o desejo de ser filhx de Deus. Assim sendo, não seria incrível, uma nova hermenêutica teológica que procure responder com respeito e práticas de inclusão, às pessoas marginalizadas pelo Catolicismo?
Rafaela Jacinto
5 Comentários
Ana
Ola bom dia, antes de mais gostei muito do seu artigo. Fazia falta aqui um artigo sobre Religião e Queer.
Concordo consigo “A teologia queer pretende abrir caminhos para que a sociedade assente no princípio de igualdade e que em Cristo, o amor seja vivido pelas pessoas na qualidade única de amor.”.
Na minha prespetiva a Igreja Católica não pode ter a mesma interpretação dos textos religiosos como era há 500 anos atrás. È necessário uma nova interpretação, outro olhar sobre as escrituras (mais inclusivo) e menos exclusivo. Esse caminho já está a ser feito em algumas partes do Brasil (Gospel LGBT) e outros.
A Igreja Evangélica na Alemanha já propôs, a esse respeito, outro caminho, embora acompanhado de violentas controvérsias, o que não surpreende, dado o assunto. No seu documento de orientação “Zwischen Autonomie und Angewiesenheit” (Entre autonomia e dependência) de 2013, ela renuncia conscientemente a aceitação literal das regras e das proibições bíblicas.
Em vez disso, tira do mandamento do amor de Jesus o critério da justiça das relações, com base no qual se deve discernir se uma relação entre seres humanos é agradável a Deus ou não.
Melhores Cumprimentos
Ana
Amigo
Muitas vezes dogma e cristianismo são apresentados a nós de forma homogênea! Minha tia ponderava sobre o casamento “de fato” e como “sacramento”: o Amor recíproco por si só já é o casamento “em si” e ai me reporto as Bodas de Cana em que o casamento ficou implícito ao mencionar noivos e festa! Outra questão que a Igreja teve que “recuar” em sua “intransigência” foi da recusa ao batismo de crianças nascidas de “casal” solteiro. Muitas vezes “buscavam” o sacramento da União para o filho não permanecer “pagão”! A renúncia de Bento XVI, com a proclamação de Papa Sul Americano, mostrou ao mundo, a necessidade de uma Igreja menos “romana” e mais universalizada!
Anónimo
A fé é um dogma e por isso mesmo não há conversa possível. Mas, não consta que Jesus Cristo tenha marginalizado quem quer que fosse. O Catolicismo é uma organização, tal como todas as ditas religiões ou credos. É como qq. partido político, qq. organização benéfica ou maléfica. Há um catecismo e quem quer pertencer, segue as normas. Depois………haverá sp quem lute para alterar, modernizar, etc. Esses serão heróis, caso se sacrifiquem pelo seu ideal e sejam capazes de penar até ao fim. Há aquela frase da psicologia básica: Quer ter razão ou ser feliz? Francisca de Castro
Anónimo
Muito interessante. Muito importante!
Terá havido desenvolvimento desta reflexão de Rafaela Jacinto? Se houve, perdi, o que lamento.
Alguém poderá informar-me se houve desenvolvimento?
Antecipadamente grato,
HP
Anónimo
“Há um catecismo e quem quer pertencer, segue as normas”, escreveu.
O “Catecismo”, tal como as “normas” já mudaram muitíssimo, ao longo dos séculos.
De contrário, ainda teríamos o Catolicismo a abençoar a escravidão, a tortura, a marginalização e a morte de quem não seguisse o “Catecismo” e as tais “normas”.
Devemos esperar a mudança (mesmo na Igreja) ou contribuir para concretizá-la ou, mais modestamente: para a ir concretizando?…
É que a própria Igreja e mais o seu “catecismo” e mais as suas “normas” já não são hoje, felizmente, o que eram dantes. E isso deve-se a quem (não raro na sociedade livre e plural) foi abrindo caminhos de luz para iluminar a própria Igreja, apagada e, para revelar nela a mundividência, clarividência que ou esqueceu ou nunca teve.
Já pediu perdão por tanta coisa. Um dia, depois de causar muito sofrimento, pedirá perdão por ter tratado muito mal os seus membros diferentes da “normalidade” oficial.