Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Dezanove
A Saber

Em Portugal e no Mundo

A Fazer

Boas ideias para dentro e fora de casa

A Cuidar

As melhores dicas para uma vida ‘cool’ e saudável

A Ver

As imagens e os vídeos do momento

Praia 19

Nem na mata se encontram histórias assim

Um abril por cumprir

fabíola cardoso

Era uma vez um país triste, cinzento.

Um país atrasado, subdesenvolvido. Um país muito fechado e só.

Neste país ser diferente era crime. Amar diferente era crime.

Crime na lei, mas principalmente na sociedade, nas famílias e escolas.

O preço a pagar por essa “diferença” era o insulto e a violência, a exclusão e rejeição, a tortura, a prisão ou o exílio.

Mesmo nas grandes cidades a heterossexualidade obrigatória convivia, no escuro, com os lugares da "libertinagem". A perseguição policial era uma constante. A marginalidade era o único chão possível. O preço de alguma liberdade era o medo e, muitas vezes, o ostracismo.

Para as mulheres a situação era ainda mais difícil, numa sociedade em que ser “esposa e mãe” era o destino obrigatório. O manto do silêncio era quase total. Uma vivência lésbica “normal” era inconcebível.

Depois houve A revolução e a esperança brotou. Mas foi rapidamente talhada: “O 25 de Abril não se fez para prostitutas e homossexuais”, disse Galvão de Melo na TV.

Foi necessário chegar a 1982 para a homossexualidade deixar de ser crime em Portugal. Passaram só 42 anos, mas fomos o movimento social que mais profundamente transformou a sociedade portuguesa.

 

Deixo alguns destaques para avivar memórias e semear futuro:

  • 1996- Nasce, em Aveiro, o Clube Safo, aquela que continua a ser a única associação lésbica em Portugal.
  • 2000 – O Clube Safo propõe às outras associações a realização da primeira Marcha do Orgulho LGBT, que saiu do Jardim do Príncipe Real, em Lisboa, no dia 1 de Julho, “por um país orgulhoso da sua diversidade”. Actualmente realizam-se Marchas um pouco por todo o país, sendo importantes momentos de visibilidade, reivindicação e celebração das diversidades.
  • 2016 – Só 6 anos depois da aprovação do casamento entre pessoas do mesmo sexo (2010) foi possível voltar a mudar a lei para que a adopção e a(lguma) procriação medicamente assistida passassem também a ser possíveis.  
  • 2018- Aprovação da lei que estabelece o direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e o direito à proteção das características sexuais de cada pessoa. Passados 6 anos a lei continua sem ser amplamente aplicada nas escolas e terá de voltar ao Parlamento.

 

Muito caminho se fez desde esse dia 25, mas o sonho da liberdade e igualdade de Abril continua por cumprir para as pessoas LGBT+. Que o digam tantos jovens que ainda hoje nas suas famílias, nas escolas, nas ruas ou no desporto, escondem as cores do arco-íris dos seus sentires e quereres. Fazem-no porque sabem que o ambiente à sua volta ainda não é seguro o suficiente. Sabem dos riscos e ameaças que ainda se fazem sentir. 

Pior. Passados 50 anos da esperança de um país digno, os rumores do salazarismo autoritário ouvem-se nos tempos de antena e nos debates televisivos. As sondagens sobre as eleições legislativas marcadas para 10 de Março assustam e as notícias vindas do estrangeiro fazem temer o pior: o medo pode voltar.  

É urgente conhecer o caminho o que nos trouxe até aqui. Compreender a sua importância política e assumirmos, individual e colectivamente, um compromisso sério com a defesa e concretização plena dos direitos conquistados com tantos anos de lutas.

Cabe especialmente aos mais jovens continuar a alargar caminhos de liberdade e evolução. Para impedir o retrocesso e garantir que os terríveis erros do passado não se repitam jamais.

Esta não é uma questão que diga respeito só às pessoas LGBT+, muito pelo contrário, ela afecta toda a sociedade e a própria democracia portuguesa.

 

Fabíola Cardoso