Bússola: "Queremos contribuir para uma sociedade mais cívica e inclusiva e para quem da comunidade LGBTI+ necessitar de apoio, de ter um local seguro e confidencial para recorrer."
Entrevistamos Alberto Torres que assumiu a Presidência da Direcção da Casa do Povo de Fermentões (CPF) em Janeiro de 2021, uma IPSS no concelho de Guimarães com mais de 40 anos de história e que há meio ano fez nascer o gabinete Bússola.
dezanove: A 30 de Junho de 2021 a CPF anuncia na comunicação social a abertura de uma nova valência, o bússola, um gabinete de apoio à comunidade LGBT+ e famílias. Enquanto Presidente da Direcção, quando foi desafiado para avançar com esta resposta, sentiu que a mesma fazia sentido para os objectivos que propunha para o futuro da CPF?
Alberto Torres: Fazia todo o sentido, pois vai de encontro à missão da CPF e aos valores que defende. Com o bússola reforçamos que somos uma instituição que promove a defesa dos direitos humanos, a cidadania, a liberdade e as diversidades. Enquanto Presidente da Direcção aceitei este desafio porque senti que ao trabalhar estas temáticas, identidade de género e orientação sexual, contribuímos para uma sociedade mais cívica e inclusiva. É essa a matriz da CPF, formar crianças desde as idades mais novas para serem pessoas que respeitam e valorizam os direitos humanos. Quando nos foi apresentada a ideia do projecto Bússola pelo Dr. Carlos Oliveira, psicólogo da CPF, eu e a restante direcção revimo-nos nela porque, como disse, trata-se de respeitar a outra pessoa como ela é, na sua plenitude.
Passados seis meses desde o início da actividade do Bússola, que balanço faz do trabalho que tem vindo a ser desenvolvido numa localidade como Guimarães considerada ainda bastante conservadora?
É um caminho que está a ser construído, um caminho para a liberdade de cada pessoa. Conseguimos em seis meses estabelecer parcerias com várias entidades de norte a sul do país, como por exemplo a AMPLOS, com quem temos vindo a construir o nosso caminho. Em Novembro estivemos no Luxemburgo num seminário que reuniu mais de 20 pessoas de vários países europeus no qual apresentamos o Bússola e o seu programa de intervenção nas escolas, tendo sido reconhecido como uma boa prática. Já realizámos várias sessões para crianças e jovens em escolas, acções de formação para profissionais das áreas da educação e acção social e acompanhamento de pessoas que solicitam apoio ao Bússola. Acreditamos que este balanço do primeiro semestre de actividade só reforça que somos necessários, há barreiras a derrubar, há pessoas a necessitar do nosso apoio, famílias que têm dúvidas e profissionais que nos pedem para saber mais acerca destas temáticas. Sabemos que podemos ter mais intervenção, quer em escolas quer em serviços de saúde, mas leva o seu tempo. Quem tem interesse e quer estabelecer um trabalho articulado connosco, sabe onde estamos e quais os nossos meios de contacto.
Somos necessários, há barreiras a derrubar, há pessoas a necessitar do nosso apoio, famílias que têm dúvidas e profissionais que nos pedem para saber mais acerca destas temáticas.
É interessante verificar que a abertura do Bússola também criou dinâmicas novas na CPF, como a abertura do ano lectivo assinalando o respeito pelas diversidades, formação em identidade de género e orientação sexual para quase todas as pessoas que trabalham na instituição, o trabalho que já está a ser desenvolvido no Pré-Escolar e no CATL. Enquanto Presidente, na sua opinião, em que medida o Bússola tem acrescentado valor ao trabalho social e educativo da CPF?
De facto foi muito interessante pois toda a CPF abraçou o Bússola e sentiu o ímpeto de avançar com várias iniciativas relacionadas com a identidade de género e a orientação sexual. No fundo só demonstramos que estamos unidos e unidas nesta causa. É inegável o valor social e educativo que o Bússola tem vindo a acrescentar, repare por exemplo que nas salas do pré-escolar abordamos o tema através de contos infantis, aliás estamos neste momento a trabalhar um conto nas três salas para depois apresentar no dia das famílias (16 de Maio), celebrando a diversidade também nas famílias de hoje. A formação de quase todas as pessoas que trabalham na CPF só vem ajudar a que as práticas educativas sejam mais inclusivas , que incluam estas temáticas nas suas planificações. Como foi bonito na abertura do ano lectivo ver as várias valências coloridas com arco-íris. E temos já uma série de actividades programadas e projectos prestes a arrancar na área social e educativa que virão consolidar o trabalho efectuado até aqui, reforçando o nosso papel activo no concelho e no distrito.
Já realizámos várias sessões para crianças e jovens em escolas, acções de formação para profissionais das áreas da educação e acção social e acompanhamento de pessoas que solicitam apoio ao Bússola.
Na sua opinião, que desafios se colocam a uma resposta como o Bússola, que é totalmente financiada pela CPF? Que expectativas tem relativamente a este gabinete?
Quando avançámos com o Bússola sabíamos da necessidade da resposta no concelho, no distrito e na região do Minho. Recentemente até nos têm chegado pedidos de outras zonas do país. Isto revela a necessidade desta resposta. Estamos a trabalhar com pessoas da CPF e algum voluntariado. Fazemo-lo com intuito de contribuir para uma sociedade mais cívica e inclusiva e para quem da comunidade LGBTI+ necessitar de apoio, de ter um local seguro e confidencial para recorrer. Sem financiamento a sustentabilidade do Bússola é um risco. Mas estamos a assumir esse risco por enquanto, porque é um serviço relevante para a comunidade. Se não o fosse como se justifica toda a actividade que aconteceu apenas em seis meses? Questiono-me se pudéssemos ter uma resposta mais activa se não poderíamos de facto enaltecer ainda mais este trabalho em outros concelhos das CIM’s Ave e Cávado. Portanto, o que eu quero dizer é que podemos potenciar esta resposta com financiamento mas, mesmo não tendo, estamos a assumi-la e vamos continuar a dar resposta a quem nos solicita apoio. Daqui a seis meses certamente seremos um serviço de referência e a CPF orgulha-se de ter dado este passo diferenciador e inovador nesta região do país.
Entrevista de Carlos Oliveira