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Krzysztof Charamsa: Padre, teólogo e gay

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Um ano depois de se ter assumido como homossexual e ter sido suspenso das suas funções no Vaticano, o padre Krzysztof Charamsa volta a ser notícia, agora ao apresentar a tradução portuguesa do livro em que conta a sua experiência dentro da Igreja.

Há cerca de um ano, enquanto decorria o Sínodo da Família, este sacerdote ficou conhecido depois de ter vindo a público assumir a sua homossexualidade e o facto de ter um companheiro. Monsenhor Charamsa, doutorado em teologia, trabalhava na Congregação para a Doutrina da Fé e foi de imediato suspenso de funções, estando desde então proibido de exercer o sacerdócio e de ensinar em universidades católicas. No entanto, é importante aqui explicar o contexto e motivo desta suspensão. Como regista Henrique Raposo, em artigo de opinião publicado no Expresso, “os membros do clero não podem ter vida sexual, seja ela qual for, porque fizeram votos de castidade”, pelo que “Charamsa não foi expulso por ser gay, foi expulso por ter violado a regra do celibato”. Realmente, na Igreja Católica, apenas os membros do primeiro grau do Sacramento da Ordem – os diáconos – podem ser casados, com a condição de o serem há já cinco anos aquando da sua admissão no diaconado, devendo manter o celibato se forem solteiros ou viúvos. Para os que queiram ascender ao segundo grau da ordem e tornar-se presbíteros – “padres” – deverão ser e manter-se celibatários. A infracção do voto de celibato resulta, teoricamente, em suspensão de funções, como aconteceu neste caso. Já muito se tem dito e escrito sobre esta questão e sobre a existência de muitos padres que não cumprem o celibato, sem que isso resulte em qualquer tipo de consequências. O que torna este caso singular é o facto de se tratar de um alto funcionário da cúria romana, de ter assumido publicamente uma relação e de o ter feito precisamente enquanto decorria o Sínodo da Família, com um claro intuito mediático. E isto leva-nos de volta ao livro e à visita do autor a Portugal.

Na passada quarta-feira Krzysztof Charamsa foi o convidado da Grande Entrevista da RTP3, onde partilhou com o público português as experiências que relata em "A Primeira Pedra: Eu, Padre Gay, e a minha revolta contra a hipocrisia da Igreja" (Lisboa, Planeta, 2016). Ao longo de quase uma hora descreveu o seu percurso, desde a sua Polónia natal até Roma, onde, para sua grande surpresa e felicidade, foi um dia convidado para pertencer ao grupo restrito de funcionários da Congregação para a Doutrina da Fé, a mais antiga e importante entre as nove congregações da Igreja Católica, sucessora directa da Inquisição e do Santo Ofício e que regula ainda hoje as questões de doutrina, assim como a punição de quem a infringe.

O teólogo assumiu-se como um crente e defensor acérrimo da doutrina, sentindo-se realizado com a oportunidade de trabalhar para o órgão máxima que lidava com essa matéria. No entanto, foi-se aos poucos desiludindo com o que foi vendo, sentindo-se hipócrita por, sendo homossexual, estar a trabalhar numa organização que perseguia e contribuía para a exclusão dos homossexuais e outras minorias. Afirma mesmo que o Papa é um “prisioneiro” dentro do Vaticano, pois, apesar de ter a última e suprema palavra em matéria de doutrina, existem imensos focos de pressão para controlar as suas decisões e comportamentos. O padre Charamsa defende que a Igreja não deve estar dividida entre conservadores e progressistas, mas sim “deve ser progressista naquilo em que não é perfeita e conservadora naquilo que é essencial, a sua fé em Deus e em Jesus Cristo, mas em tudo o resto em progresso e evolução.”

No entanto, apesar do descontentamento e do apelo à mudança, o agora activista não deixa de frisar que estas “são críticas aos homens da igreja”, que se identifica “com toda a Igreja”, incluindo a parte que critica, e que “há muitíssimos católicos fantásticos. Há muitíssimas forças e energias no catolicismo e a Igreja é muito mais que o Vaticano ou que certos episcopados ou conferências episcopais ou clero.”

 

Tiago Silva