"Manifesto pelas Identidades e Famílias: Portugal Plural" de João Costa
“Fazer festa nos 50 anos do 25 de Abril é celebrar a inquietude perante a exclusão. É saber que vivo num país melhor, muito melhor, mas que ainda não é de todos e para todos. É saber que enquanto houver segregação, pobreza, desigualdade, exclusão, o caminho está aqui para ser trilhado. É cantar por cada passo dado, com os olhos postos em todos os impossíveis que ainda estão por desbravar.”
Manifesto pelas Identidades e Famílias: Portugal Plural, de João Costa, ex-ministro da educação (2015-2024), é um livro que sendo composto por dez pequenos capítulos não deixa de ser uma pedra no charco no ano em que é publicado. Dedicado “aos que temem a liberdade e a diversidade”, esta obra pretende afirmar-se como contra-resposta ao episódio do passado dia 8 de Abril de 2024, dia em que é apresentado o livro “Identidade e Família: Entre a consistência da tradição e as exigências da modernidade” de António Bagão Félix, Victor Gil, Pedro Afonso e Paulo Otero, um conjunto de figuras da academia e política portuguesa conotadas com a direita conservadora que, entre outras coisas, nessa obra, pelo meio de quase duas centenas de páginas, defendem o “ataque à família tradicional”; “a sovietização do ensino”; a fantasmagórica “ideologia de género” e o papel “inato” da mulher para as funções domésticas.
“Estamos melhor, muito melhor, são muitos os que estão melhor. Não vale a pena virem dizer que tudo se degradou, porque não é verdade. Saiam da rede social onde se grita mais alto e olhem para os dados, para as evidências, para a vida concreta das pessoas. (...) O discurso da degradação, da teoria do caos, o passadismo e saudosismo são cobardes. São a procura da manutenção do privilégio, são o medo de aceitar a diferença e de deixar que outros tenham os direitos que temos. Seja o direito de viver, seja o direito de pensar, seja o direito de expressar, seja o direito de amar.”
Numa época em que assistimos ao avanço das extremas-direitas, ao crescente radicalismo dos populismos e ataque às políticas públicas ditas de esquerda, políticas que vieram consagrar, entre outras coisas, o direito à igualdade e não discriminação, o direito ao aborto; a educação sexual nas escolas; o casamento entre pessoas do mesmo sexo ou mesmo o direito à morte medicamente assistida, o autor segue uma linha de raciocínio afiada em que não só expõe a ideologia sustentada pelos “arautos” de um tempo passado vivido no medo e censura como nesse saudosismo mostra o perigo no retrocesso de direitos recém-alcançados.
Defendendo de forma simples e inteligente o valor da empatia como traço intrínseco à democracia, à arte pela liberdade, à educação para os Direitos Humanos, este livro mostra a sua pertinência num tempo de radicalismos e de maior indiferença para com aquilo que nos é desconhecido e dissemelha. Um livro que combate a ignorância, o preconceito e a violência simbólica afirmada entre figuras da actual política portuguesa. Um livro de leitura obrigatória!
ISBN: 978-989-740-325-5
Editor: Ideias de Ler
Páginas: 124
Daniel Santos Morais é mestre em Sociologia pela Universidade de Coimbra. Feminista, LGBTQIA+, activista pelos Direitos Humanos. Partilha a sua vida entre Coimbra e Viseu. É administrador do site Leituras Queer.