A complexa simplicidade de Variações
1983, não estamos em Braga, nem sequer em Nova Iorque, nem tão pouco em Lisboa e muito menos em Fiscal, Ovar ou Sines. Estamos dentro da mente de António Variações. Mas não é uma introspecção qualquer, nem um monólogo a falar consigo mesmo. São as variações de uma pessoa que acaba por ser várias. São as “Variações, de António” de Vicente Alves do Ó e Sérgio Praia, para ver na sala Mário Viegas do Teatro Municipal São Luiz, em Lisboa, de 24 de Junho a 10 de Julho, de Quarta a Sábado às 22h e Domingo às 17h30.
Sinopse:
Lisboa. Anos 80.
António e Amália estão prestes a cantar no mesmo palco. Faltam poucas horas. Será um dos momentos mais importantes na vida do cantor, barbeiro, esteta, lisboeta minhoto e minhoto universal, que nunca foi uma coisa só, mas sim um homem de muitas variações com nome de santo. Faltam poucas horas para o espectáculo. Repetimos. E nestas poucas horas, uma vida inteira regressa ao primeiro anoitecer em Fiscal, onde todas as sombras eram feitas de medo e a infância fazia-se a cantar.
António Variações está sozinho em palco, o momento são os instantes que antecedem o concerto na Aula Magna, onde irá fazer a primeira parte de Amália Rodrigues. O espectáculo aconteceu mesmo, foi em 1983, um ano antes da sua morte e no auge do seu reconhecimento artístico. Nestes bastidores António, que apesar de estar sozinho está acompanhado por si próprio, vai tecendo o que deu origem à persona, “o maluquinho”, da simplicidade de um miúdo de 12 anos, que já era complexo, à sofisticação em que se tornou Variações.
Depois de Florbela Espanca e com Al Berto a caminho Vicente Alves do Ó (na foto acima) abraçou a escrita, a encenação e a cenografia, trazendo-nos um retrato pouco convencional de uma figura incontornável da cultura portuguesa: António Variações. O desafio foi lançado por Sérgio a Vicente e este, de imediato, acedeu ao pedido. Alves do Ó foi beber a inspiração não só à biografia escrita por Manuela Gonzaga, como também estudou as letras das canções e falou com familiares e amigos do cantor. Mas, talvez a maior inspiração tenha sido o próprio actor.
O projecto de libertar o António que tem em si é antigo. Dá corpo, mente e voz às “Variações, de António”. Sérgio já tentou em 2012 com o realizador João Maia trazer “cá para fora” o seu Variações em filme, mas sem sucesso ainda – não está esquecido, irá a concurso no ICA brevemente. O actor tinha “uma necessidade urgente … depois de tantos anos e não ter sido vivido [em que] não havia suor, não havia pele, não era palpável, não era visível” havia a necessidade de “deitar cá para fora” este personagem.
Nas palavras de Vicente “Isto é uma trindade. Eu, o Sérgio e o António somos uma trindade. (…) Nós os três temos muito o mesmo percurso. Seja na forma como vivemos em família, seja na forma como obcecadamente sonhávamos com qualquer coisa. O Sérgio é de Ovar, eu sou de Sines e o António era de Fiscal. Somos pessoas determinadas em chegar à cidade e cumprir um sonho. […] Não há nada nele que seja falso”. É a simplicidade, como Sérgio queria, que está presente na peça. Uma complexa simplicidade de um dos maiores nomes da música e o maior ícone gay português.
“Variações, de António” para ver na sala Mário Viegas do Teatro Municipal São Luiz, em Lisboa, de 24 de Junho a 10 de Julho, de Quarta a Sábado às 22h e Domingo às 17h30, bilhetes a 5€, 8,40€ e 12€, produção Buzico! Produções Artísticas.
Luís Veríssimo