Presença de trabalhadores do BNP Paribas na Marcha divide organizações LGBT
Pelo menos duas associações aproveitaram o momento dos discursos para deixarem claro que estavam contra a presença do BNP Paribas na Marcha do Orgulho LGBTI de Lisboa. Esta foi a primeira vez que um grupo de pessoas ligadas a uma empresa privada desfilou na marcha.
A presença do grupo de trabalhadores do banco francês tinha já levantado mal estar durante a organização da fase de preparação da marcha, já que terá sido votado que não seria permitida a presença de marcas ou empresas no desfile. Apenas a ILGA estaria a favor da presença do BNP Paribas.
Logo no arranque da marcha, confirmou o dezanove, a questão chegou ao conhecimento da secretária de Estado da Igualdade, Catarina Marcelino, e do vereador dos Direitos Sociais, João Afonso. Ao longo da manifestação, que começou no Príncipe Real, eram visíveis referências indirectas ao caso, com os cartazes: “Não há orgulho em ser banqueiro” e “os bancos sugam-nos a vida”. No palco, os representantes das Panteras Rosa e da Academia Cidadã repetiram essas frases, mas foi a porta-voz do colectivo das Panteras quem foi clara no alvo: BNP Paribas.
Diogo Pereira, fundador do grupo BNP Pride, que agrupa os funcionários LGBT e aliados em Portugal, desvaloriza a questão. “Não tive conhecimento do mal estar de outros grupos. A organização da Marcha pediu-nos para marchar junto às outras organizações que não fazem parte da comissão, no final. Atrás de nós seguiam grupos como o Tudo Vai Melhorar”, descreve ao dezanove. O mesmo responsável refere que não esteve presente na parte dos discursos, já na Ribeira das Naus, mas argumenta que “o ponto aqui não é pertencermos a um banco mas sim sermos uma rede de funcionários de uma grande empresa que procura procura promover a visibilidade e inclusão LGBT no local de trabalho”.
O convite para que o grupo Pride do BNP Paribas integrasse a Marcha partiu da ILGA, refere Diogo Pereira, no seguimento da participação no projecto da Carta da Diversidade Portuguesa. “Os nossos valores de igualdade e visibilidade enquadram-se na Marcha e considero que é da maior importância participar nestas iniciativas. Para além do trabalho das organizações que habitualmente participam na marcha, a network procura promover a partilha de boas práticas no local de trabalho”. O grupo conta mais de 160 membros, entre funcionários LGBT e aliados, tendo passado pela Marcha cerca de 30 pessoas.
Trocas de argumentos seguem nas redes sociais
O debate tem prosseguido nas redes sociais. No Esqrever, blogue próximo da ILGA, Nuno Miguel Gonçalves, aborda a questão num texto que está a ser promovido como post patrocinado no Facebook. “A polémica do ano foi uma das associações decidir convidar um banco e uma discoteca para marcharem a seu lado. Tal como acontece em todos os Prides do Mundo. Um sinal de visibilidade não só de apoio às pessoas LGBT que empregam como também uma promessa explícita de não discriminação das pessoas LGBT no uso desses serviços. Basta ir ao site da Marcha de Nova Iorque para ver T-Mobile, TD Bank, Coca-Cola, Facebook, Axa, Hilton, e muitos outros, como alguns dos patrocinadores e apoiantes dos Pride”, exemplifica.
Sérgio Vitorino, do colectivo Panteras Rosa, condenou, num post publicado no Facebook, o “comportamento da associação ILGA-Portugal, que após ter votado sozinha pela participação do banco, fingiu ter acatado a decisão democrática, omitiu o patrocínio directo de uma marca comercial a uma das suas viaturas, desrespeitou frontal e conscientemente as restantes associações com quem partilha a comissão organização da Marcha e mostrou, pela enésima vez no contexto da Marcha, como a sua noção de democracia está mais perto da imposição pelo mais forte do que da ideia de trabalho colectivo”. Para o activista, e a propósito do caso BNP Paribas, “a Marcha não é um suporte publicitário, muito menos para um dos maiores bancos do lóbi do petróleo e do carvão, conivente com a ditadura militar birmanesa vir fazer de defensor dos Direitos Humanos. Acusar a organização da Marcha do Orgulho de ser responsável pela não adesão à causa do empresariado português é só… má fé”. Sérgio Vitorino refere ainda que “uma coisa é haver um grupo de trabalhadores que marcha enquanto trabalhadores LGBT da empresa ‘x’, seja por visibilidade, seja para denunciar situações laborais, seja até para mostrar um exemplo de boas práticas laborais contra a discriminação, outra bem diferente é um banco, com boas práticas ou não – aproveitar e promover a ida dos seus trabalhadores para utilizar a Marcha como terreno de “marketing social”.
Como funciona o grupo Pride
O grupo Pride do BNP Paribas arrancou em Novembro do ano passado, mas só em 17 de Maio foi oficializado. De acordo com Diogo Pereira pretende “promover um local de trabalho aberto, seguro e inclusivo para que os funcionários LGBT possam ser eles próprio, através da consciencialização para a diversidade e promoção e partilha de boas práticas que poderão, eventualmente, ser adoptadas por outras entidades. O banco é uma instituição aberta aos funcionários para criar ferramentas para uma cultura de melhor ambiente de trabalho. O banco mantém sempre as portas abertas para ouvir as nossas sugestões e disponibiliza apoio na comunicação e organização de eventos. Também contamos com o apoio de membros senior do banco em delinear alguns projectos”, assegura. Agora, nos planos da Pride está a organização de conferências e sessões de awareness sobre a temática LGBT dentro do banco.
Ao contrário do que estava inicialmente escrito, Nuno Miguel Gonçalves não pertence à ILGA. Nuno Gonçalves é que integra a associação, sendo alheio à publicação do texto no blogue Esqrever. O Esqrever esclareceu, em Fevereiro de 2018, que não está de qualquer forma associado à ILGA nem a qualquer associação LGBT, tendo, no entanto, já trabalhado com várias associações da área.
Rui Oliveira Marques
Encontras aqui todas as fotos da Marcha do Orgulho LGBTI de Lisboa