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Não queremos celebrar meio século de democracia com um governo apoiado pela extrema-direita

miguel salazar

A poucas semanas da celebração dos 50 anos do 25 de Abril, aceitei falar sobre Liberdade, nomeadamente no que diz respeito à comunidade LGBT+. Este é também um tema crucial, não somente pelo acontecimento histórico em si, mas pelo facto de que enfrentamos eleições legislativas e a dúvida sobre como será a futura composição parlamentar faz soar vários alarmes.

Não queremos celebrar meio século de democracia com um governo apoiado pela extrema-direita, isso é certo, mas sabemos também com o quê que podemos contar com a direita dita moderada. Não me alongarei a desenvolver todas as vitórias conquistadas no Parlamento que trouxeram à comunidade LGBT+ a possibilidade de viver num país mais igual, com mais direitos e mais inclusivo, desde a aprovação do casamento igualitário e da adopção à despatologização da identidade trans através do reconhecimento da autodeterminação de género, para ter de dizer o óbvio: direitos e direita nunca foram sinónimos.

Sempre houve razões para este espectro político que justificassem não acompanhar diplomas que visavam dar mais liberdade à nossa comunidade: foi a crise na economia, foram os problemas por resolver no Estado Social, foi a suposta falta de debate a nível nacional, foi a aclamada inversão de prioridades em comparação com outros debates a serem feitos no plenário, foi a fractura e a crise social que se poderia gerar, foram os especialistas que dizem não terem sido ouvidos ou foram até razões de ordem técnica, umas palavrinhas a serem alteradas no projecto-lei, um artigo aqui e ali, mas há um padrão que se mantém e já nos familiarizamos com isso. O voto contra.

Na verdade, até foi esta última desculpa – a das questões técnicas – que levou o PSD a votar contra a criminalização das práticas de conversão. Da extrema-direita, não esperávamos o que quer que fosse, mais não seja pelo facto de acolherem bem quem defenda este tipo métodos desumanos e anticientíficos, contudo, apesar do histórico do PSD que acabei de referir, eu e certamente várias pessoas esperávamos desta bancada uma posição diferente, visto que afirmaram não se reverem neste tipo de práticas contra a comunidade LGBT+. Felizmente, a força parlamentar que tinham não foi suficiente e, hoje, quem tentar alterar a orientação sexual ou identidade de género de alguém terá a devida e merecida consequência. E, a respeito deste tema, como uma vez me disse o meu amigo que redigiu este diploma em nome da bancada do Partido Socialista, “ontem, já era tarde”.

Desde 2015 que o povo português elegeu uma maioria parlamentar que nos permitiu cumprir Abril no âmbito dos direitos LGBT+, durante oito anos temos avançado de forma incansável, mas o cenário futuro, como referi, pode configurar um atraso, um impedimento ou até um retrocesso nos direitos que temos alcançado. Neste caso, deparar-nos-íamos com os 50 anos da Revolução que, segundo o general Galvão de Melo, não foi feita para  homossexuais.

Diz-nos a comunicação social que o discurso LGBTfóbico tem aumentado na Europa, mas sabemos também o palco que a comunicação social dá ao discurso de ódio, sabemos a teia de interesses que justificam esse palco e a tradução que isso tem na opinião pública, sabemos da importação do papão da ideologia de género da extrema-direita internacional, sabemos da fragilidade do fundamento dos discursos que nos transformam num bode expiatório para os problemas que o Estado Social tem, sabemos do papel fundamental do fundamentalismo cristão para o crescimento deste fenómeno, mas sabemos também que esta é a única forma do fascismo levantar-se dos escombros: mentindo e manipulando.

Não é preciso sermos peritos e peritas em política para percebermos que uma representação reforçada da extrema-direita significa também um aumento de casos de violência manifestada de diversas formas contra a comunidade LGBT+. Se o ódio cabe na casa da democracia, cabe também na rua, no local de trabalho, no hospital, na escola e em casa. O ódio e toda a natureza de agressões que ele acarreta.

Não é preciso sermos peritos e peritas em política para percebermos que uma representação reforçada da extrema-direita significa também um aumento de casos de violência manifestada de diversas formas contra a comunidade LGBT+. Se o ódio cabe na casa da democracia, cabe também na rua, no local de trabalho, no hospital, na escola e em casa. O ódio e toda a natureza de agressões que ele acarreta.

Que possamos celebrar mais 50 anos de democracia em toda a sua plenitude porque, sim, a Revolução também foi feita para nós.

 

Miguel Salazar