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Ocupar a rua, a cor é rosa: resistir e viver!

colombina clandestina

O grito de Carnaval simboliza a sua abertura, uma reivindicação do povo do carnaval, mas, sobretudo, a necessidade de reclamar anualmente a Liberdade! O Bloco da Colombina Clandestina está novamente a ocupar a rua para voltar a gritar pela liberdade e igualdade.
 
Apesar de parecerem temas batidos, numa sociedade lisboeta ainda muito marcada pela colonialidade mental e pela discriminação, o posicionamento da Clandestina exige acção artivista permanente.
“O tema do carnaval é a cor rosa com o objectivo de ocupar o espaço público fazendo a união entre as pessoas, todas as pessoas, brasileiras, portuguesas, espanholas, italianas.
Fizemos um levantamento das nacionalidades no Colombina e só membros activos são mais de 10 nacionalidades entre as nossas mulheres. Quando a gente fala de ocupar o espaço público a ideia é ocupar com a força das mulheres e a cor escolhida foi a cor rosa”, refere Andreia Freire, idealizadora do projecto e mestra da Bateria Clandestina.

colombina clandestina

A conversa com o dezanove.pt decorreu no Village Underground, em Alcântara, numa tarde de sol brilhante. Os membros da bateria já estavam a aquecer os instrumentos, a voz e o corpo, pintando o espaço de cor de rosa, cor escolhida para ocupar a cidade de Lisboa para o Carnaval de 2024.

“Todos os ensaios pré carnaval é para a gente arranjar fundos para o carnaval na rua que envolve altos custos desde autorizações, policiamento e licenças que são gastos muito grandes e que ficam acima da realidade dos blocos. Em todos os eventos temos artigos para vender, tudo que a gente coloca aqui serve para viabilizar o carnaval na rua, porque não temos apoios de nenhuma instituição”, destaca Andreia Freire.
A rua está na génese da Colombina, desde a sua fundação há sete anos pelas ruas de Alfama. Desde lá tem uma estrutura organizativa que presente promover os seus três pilares fundamentais: “luta feminista, diversidade e ocupar a rua, porque para a gente fazer o Carnaval tinha que ter uma mensagem”.
A Colombina Clandestina é um bloco de Carnaval, mas é sobretudo um espaço de construção de cidadania, cooperação e liberdade. Os iniciantes da bateria são chamados a mostrar as suas aprendizagens em público e na rua, gerando laços e comunicação. "Quem entra para as aulas de percussão não é sobre percussão que vai aprender, mas sim sobre comunidade, partilha de valores. Estás com pessoas que acreditam que podem fazer a diferença numa sociedade cheia de desigualdades", destaca Andreia.
As acções de ocupação do espaço público permitem ainda que o Bloco da Colombina Clandestina envolva os lisboetas numa festa cada vez mais importante para a cidade gentrificada pelo turismo. "O Carnaval na rua é sobre pegar nos corpos que estão sempre a ser excluídos e marginalizados e colocá-los no centro e dizer bem alto: hoje você vai brilhar". Mulheres, imigrantes, pessoas LGBTQIA+ têm de reafirmar a existência e resistência”. Segundo Andreia, a Câmara Municipal de Lisboa com os seus expedientes burocráticos e de licenciamento deseja que o bloco não saia à rua, “mas nós recusamos, porque queremos trazer quem não tem a oportunidade de brilhar nas ruas durante o ano e poder fazer connosco essa proposta de cidadania, ocupar a rua através da arte.
 

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Preparação dos integrantes do Bloco Colombina Clandestina .jpeg

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Primeiro eram os batuques
Diogo Presuntinho é o professor dos iniciantes da bateria da Colombina Clandestina. Músico experiente, tem dirigido os diversos naipes que compõem os ritmos do Carnaval como as marchinhas, o reggae e claro o samba. “A bateria é a ferramenta condutora do evento que está a decorrer. A bateria está conectada com os corpos, com o nosso coração. É a bateria que vai servir de estrada para a viagem que nós queremos fazer neste carnaval”, refere na nossa conversa no pátio do Village.
Para mestre Presuntinho a ligação gerada pelos ritmos e músicas do carnaval trazem uma história que passa para os foliões gerando novas histórias numa infinitude de possibilidades de participação naquela que para ele é a festa da liberdade.” A fantasia do Carnaval serve para se experimentar outras possibilidades e todos podem ser tudo. O Carnaval é liberdade”, refere na entrevista.
Para que as pessoas estabeleçam a comunicação é preciso estar, sentir e viver. Para mestre Presuntinho a bateria tem essa capacidade de abrir corações e horizontes. “O Carnaval é por natureza activista, porque ocupa o espaço público e os corpos das pessoas. E a bateria é o som da ancestralidade de uma África raiz que paira nos nossos corações. O ritmo junta as pessoas, liga-as e antes da palavra tem o ritmo e o batuque. A bateria quebra as barreiras e depois permite o diálogo”.
Para Diogo Presuntinho o Bloco da Colombina permite essa participação inclusiva através da arte e da fantasia do carnaval. Ensinar pessoas de várias nacionalidades a tocar instrumentos de percussão para o Carnaval tem sido muito importante, porque segundo ele os ritmos de Carnaval têm o poder transformar as pessoas que saem à rua para celebrar e dançar. “Quando você olha para uma pessoa na bateria que nunca tocou e está tocando, a pessoa é o rolê, é o movimento e a festa e isso é muito importante. São pessoas que se deixam levar pelo ritmo da música e essa exposição da pessoa é um momento muito importante para a pessoa se sentir ligada à pulsação, ao chão que nos une”.

 

Ocupar as ruas, gritar a liberdade, Colombina é feminista!
Camila Randon, cantora de samba, teve a sua estreia, neste domingo, dia 21 de Janeiro, no palco do Village Underground. Um desejo concretizado pela intérprete que canta em blocos de samba há muitos anos e que chegou a Lisboa, desde a cidade de São Paulo, Brasil. A escolha do repertório alinhou-se com a cor rosa da Colombina para este Carnaval que quer ecoar as vozes de mulheres, mulheres trans do samba como Alcione, Beth de Carvalho, Liniker e Johnny Hooker.
A cantora refere que é um privilégio cantar no bloco da Colombina, o maior e mais representativo de Lisboa e aquele cujos valores Camila se identifica totalmente. “Vimos de muitos anos de batalha. A divisão política está ai e tem hora que necessitamos de nos alimentar com cooperação, amor, cuidado e com um abraço. É importante lutar pela liberdade e pela democracia com a cor rosa”.
Camila quer emprestar a voz a este movimento de alegria, cuidado e cooperação, que abraça todos aqueles que se sentem excluídos. “Neste momento de guerras nós precisamos nos alimentar no amor, destaca a cantora que levou a tenda do Village ao rubro com o seu canto.
A energia desta abertura do Carnaval foi incrível e contagiante segundo alguns relatos de foliões no local que tiveram ainda a oportunidade de ver e ouvir o Colectivo Gira, roda de samba constituída apenas por mulheres.. Com casa fixa em Alfama o Gira tem agora a sua presença regular na zona de Marvila, no Clube Oriental de Lisboa, às sextas-feiras.

As parcerias entre a Clandestina e o colectivos de artivismo têm construído uma cidadania que reclama cidade e que reclama o direito à cidade. É o caso da ligação que o Bloco tem com os movimentos pela habitação, a marcha da greve feminista de 8 de Março e a integração na organização da Marcha do Orgulho de Lisboa (MOL). “Desde que existe mundo a subversão do Carnaval é a primeira festa a ser suprimida pelos regimes de extrema-direita e ditatoriais. E enquanto houver Colombina nós ocuparemos a rua para construir igualdade e liberdade, reforça Andreia Freire.

A abertura do Carnaval no Village contou ainda com a DJ KLNG KAMI que tem, através do seu som, construído um espaço de inclusão para as populações LGBTQIA+ numa atmosfera de liberdade.
Nas próximas semanas o Carnaval do Bloco da Colombina vai ocupar a rua mais duas vezes, 28 de Janeiro e 4 de Fevereiro. Estes eventos serão o “esquenta” do Carnaval até ao grande Baile da Colombina, com a cobertura das ruas de Lisboa de Cor-de-Rosa, no cortejo da Colombina que está marcado para o dia 10 de Fevereiro, pelos bairros de São Vicente e da Graça.

 

 
André Soares